SARKOZY QUER UM ISLÃO «FRANCÊS»

Será um tiro do pé de Nicolas Sarkozy? O Presidente francês quer um "islão francês".

E para debater o islão, que é a segunda maior religião em França, e a sua compatibilidade com as regras da República laica, o partido do Presidente, a UMP, vai promover, no início de Abril, uma grande convenção.

Os líderes religiosos dizem-se assustados com as possibilidades de estigmatização do islão depois de ouvirem Jean-François Copé, secretário-geral da UMP, anunciar esta convenção, a seguir a um pequeno-almoço de trabalho dos deputados com o Presidente.

Mohammed Moussaoui, presidente do Conselho Francês do Culto Muçulmano, reagiu com prudência, adianta o Libération: disse ser "louvável" ver que se presta atenção ao exercício dos cultos, mas disse temer que o debate "derrape" e ponha em causa o islão, como aconteceu com o debate sobre a identidade nacional.

Mas Marine Le Pen, a nova líder do partido xenófobo Frente Nacional (FN), esfrega as mãos de contente. Foi ela que, em Dezembro, fez barulho com a questão de a laicidade de França estar a ser ferida pelos muçulmanos que rezam nas ruas - que comparou à ocupação nazi, na II Guerra.

Marine Le Pen foi então criticada de forma unânime, mas a sua popularidade é maior do que alguma vez foi a do seu pai, Jean-Marie Le Pen, que substituiu na liderança da FN. Por isso, no dia em que uma sondagem Ifoppublicada pelo jornal France Soir a dava como senhora de 19 a 20 por cento das intenções de voto, se se candidatasse às presidenciais de 2012, teve o desplante de enviar um agradecimento a Sarkozy e à UMP por estarem a colar-se às suas palavras.

"Mais um esforço, senhor Copé! Mais um debatezinho, um bocado de blá-blá sobre o islão, a laicidade, e penso que efectivamente poderemos acabar com 25 [por cento] nas presidenciais", atirou ela aos microfones da rádio France Info, dirigindo-se ao secretário-geral da UMP.

O Presidente da República "está a brincar com o fogo", comentou o socialista Manuel Valls. "As propostas da UMP e do chefe de Estado estão a alimentar a FN." O ex-primeiro-ministro Dominique de Villepin, rival jurado de Sarkozy, alerta para o mesmo. "Tivemos o debate sobre a identidade nacional, sobre a burqa, a questão dos ciganos, e no fim de tudo isto temos a FN com 20 por cento."

A ideia serviria a Sarkozy para se aproximar da direita mais radical. Mas a estratégia pode ser um tiro que sai pela culatra, como terá avisado o ministro da Defesa, Alain Juppé, no pequeno-almoço de terça-feira com os deputados da UMP, a crer na citação feita pelo Libération: "Se nos lançarmos neste tema, atenção à aterragem."

Pois é - mas que há-de o presidente fazer, depois de já estar tudo à mostra e de o povo se revelar cada vez mais favorável às posições da extrema-direita? Uma chatice, a realidade não se poder ocultar toda a vida, obriga-se a que um bom multiculturalista «de Direita
» como Sarkozy tenha de engolir os sapos que for preciso a ver se estanca a sangria desatada que a FN está a provocar...
E, entretanto, continua a fazer a apologia da misturada, como já fazia antes
, uma vez que a sua ideia agora é a criação de um «Islão francês». Critica o modelo anglo-saxónico de integração - que permite a separação das culturas - como se o modelo francês não fosse, há toneladas de anos, o da mistura a todo o custo. Sim, este modelo da misturada dê lá por onde der, não é novo. Estar por isso a dizer «agora é que vai ser uma harmonização a sério» não passa de mais um arremesso de areia aos olhos da população.

Não há por isso nenhuma autêntica defesa da identidade nacional a não ser a que os Nacionalistas da extrema-direita propõem.