sexta-feira, dezembro 19, 2003

JUSTIÇA PARA TODOS

Segundo notícia de hoje, grande parte dos clubes de futebol não anda a pagar as suas dívidas ao fisco.

Só num país abananado se permite isto: abuso cometido por instituições cujo contributo para a sociedade se situa ao nível do mero divertimento. A maior parte do povo gosta da bola a correr sobre a relva, e pronto, os donos desse negócio fazem o que querem e lhes apetece.

Quando o País está em crise (enfim, lembro-me de andar a ouvir isto a vida toda, mas dizem que agora é pior porque vamos ter, em breve, a concorrência feroz dos países de leste, que estão, económicamente, em marcha acelerada), há uns quantos senhores que se permitem auferir rios de dinheiro (tanto presidentes de clubes, como treinadores, como jogadores de futebol) enquanto legiões de adoradores seus - tantas vezes subservientes - vão-se afundando na mediocridade miserável - alguns dos «ídolos», que recebem fortunas mensais, resolvem pôr-se a exigir ganhar boas maquias sem impostos, no intervalo de um jogo de importância decisiva num campeonato mundial (quase que parecia chantagem...), e, enquanto isso, os seus Zés-Devotos até choram de alegria quando compram um bilhete para uma final europeia, depois de terem aguardado dias numa fila que se inicia quase uma semana antes de as bilheteiras abrirem.

Não será fanatismo a mais?

Alguns afirmam que não, porque o futebol faz isto e aquilo, e dá de comer a muita gente (lá isso, dá...), e é uma coisa na qual «somos muita bons!».

Mas seremos assim tão bons? Em termos de campeonatos mundiais, o máximo que conseguimos foi um terceiro lugar em 1966. Não passámos dos oitavos de final do Campeonato de 1986, no México. Nem sequer estivemos presentes em vários dos mais recentes Campeonatos do Mundo: nem em 1982 (Espanha), nem em 1990 (Itália), nem em 1994 (E.U.A.), nem em 1998 (França). Quanto ao resultado obtido no Mundial de 2002, pode dizer-se que não foi dos melhores.
Que eu saiba, também nunca ganhámos nenhum Campeonato da Europa, e o melhor que teremos conseguido numa competição dessas consistiu em dois terceiros lugares (1984, em França, e 2000, na Holanda e na Bélgica).

Isto, no que respeita à selecção nacional.

No que se refere às equipas, constata-se que têm vindo a piorar desde os anos oitenta. Nessa altura, o Futebol Clube do Porto venceu uma taça dos Campeões Europeus; nos anos noventa, os noticiários começam frequentemente com notícias futebolísticas, há toneladas de mesas redondas sobre o chamado «desporto-rei», problematiza-se sobre a magna questão da crise no futebol português, e a corrupção e etc., e, depois, quando o referido F.C. do Porto vai disputar uma final de uma taça muito menos importante do que a dos Campeões Europeus, é seguido de boa parte do governo, mais uma grande quantidade de deputados, mais não sei quem, todos para Espanha, só para assistir ao jogo. E deitam foguetes com o resultado, e é assim que Portugal obtém um dos seus triunfos mais valorizados pelos seus média.

Em contrapartida, dá-se pouca importância a um desporto no qual somos realmente bons, o hockey em patins:ganhámos mais campeonatos do mundo do que qualquer outro país, e este ano voltámos a vencer. Mas não se registou nos média nenhuma grande comoção nacional.

Dizia Nietzsche que não gostava de igrejas porque cheiravam a povo, e, segundo o filósofo, tudo aquilo em que o povo toca, cheira mal.
Estou longe deste elitismo bacoco - no entanto, não deixo de achar que há demasiada gentalha a mexer no futebol português, a preocupar-se com o futebol, a chorar pelo futebol, e depois é evidente que o aroma vindo dali não é dos melhores.