quarta-feira, outubro 30, 2019

SOBRE O LUGAR DA ALVURA E DA COR NO BOM GOSTO DO OCIDENTE



Ando há meses, se calhar mais de um ano, para aqui referir um artigo medianamente interessante sobre a cor na cultura ocidental a partir dos modelos clássicos, este: https://www.artsy.net/article/artsy-editorial-people-classical-sculptures-meant-white

Trata-se aqui de salientar o facto de que, como se descobriu na época contemporânea, as estátuas da Antiguidade clássica eram, afinal, intensamente coloridas, ao contrário do que se pensou desde a Renascença. Ainda hoje se visualiza a arte greco-romana como um composto de linhas da maior elegância a definir objectos de absoluta brancura. Foi a partir daqui, conforme diz a autora do artigo acima referido, que no Ocidente se gerou a ideia de que «o bom gosto» por excelência era monocromático e claro como a cal. O profusamente colorido, o que se salienta por cores intensas, foi ficando relativamente relegado para as classes populares; ainda hoje o «fino», o estiloso, é tudo de uma só cor, no máximo duas, e quase sempre esbatidas, mate. O «excessivamente» luminoso é tido como popularucho, «rasca». Seria irónico dizer a Octávio César Augusto, primeiro imperador do maior Império do Ocidente, figura de proa da mais esplendorosa romanidade, que a sua estátua tinha cores foleiras, de «povinho»:


A autora pega nisso para se estender sobre a adoração da brancura no contexto rácico-cultural ocidental moderno. Nestoutro artigo faz-se o mesmo: https://www.newyorker.com/magazine/2018/10/29/the-myth-of-whiteness-in-classical-sculpture, o que passa para o campo do desnecessário - não é preciso grande investigação para sacar do mundo antigo exemplos em que o branco era de facto especialmente honrado, antes de mais nada porque se qualificava como a cor do sagrado por excelência, a da indumentária da generalidade dos sacerdotes indo-europeus, do Druidismo céltico ao dos Brâmanes da Índia, passando, grandemente, pelos clérigos helénicos e latinos; nas «Suplicantes», de Ésquilo, é bem marcada a diferença entre a alvura dos Argosianos e a pele escura dos invasores egípcios, bem como das refugiadas «egípcias»(?) de remota ascendência helénica; a brancura da pele é igualmente salientada, desta feita por Homero, em mais de uma figura de Tróia,  enquanto as Deusas são sempre representadas com notória clareza epidérmica...