quarta-feira, agosto 01, 2018

PRESO NA TURQUIA POR TERRORISMO... QUANDO DENUNCIAVA TERRORISTAS

De que maneira o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, enfrenta os seus adversários políticos incluindo os que deram o sangue para expor as atrocidades do grupo terrorista Estado Islâmico (ISIL)? Jogando-os na cadeia por supostamente "apoiarem o terrorismo".
Desde o fracassado golpe de 2016 na Turquia, Erdogan tem vindo a promover uma descomunal e violenta repressão contra opositores e críticos: como políticos, activistas políticos, jornalistas e membros das forças de segurança e do exército turco.
A mais recente vítima dessa repressão é Eren Erdem, ex-deputado do principal partido de oposição, Partido Republicano Popular (CHP), conhecido por expor os crimes do ISIL e de outros grupos terroristas.
Erdem foi detido recentemente acusado de "ajudar uma organização terrorista", ele também está sendo investigado por "insultar o Estado Turco". Erdem está sujeito a uma pena de 9 a 22 anos de prisão por "consciente e voluntariamente ajudar, como não membro, uma organização terrorista armada", "revelar a identidade de uma testemunha anónima" e "violar a confidencialidade da investigação".
Autor de nove livros, Erdem trabalhou como jornalista antes de ser eleito membro do parlamento pelo CHP em Istambul em 2015. É provavelmente o membro mais corajoso do parlamento, que expôs as actividades do ISIL por toda a Turquia durante o seu mandato e tem insistido que o partido ora no governo, Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP), pare com a repressão e traga os criminosos às barras da justiça.
Erdem citou com detalhes evidências de processos criminais, indiciamentos e investigações conduzidas por autoridades estaduais, bem como boletins de notícias nas suas declarações e moções no parlamento. A 10 de Dezembro de 2015, por exemplo, Erdem proferiu um discurso no parlamento da Turquia sobre as actividades do ISIL no país. Entre outras coisas consta a transferência dos ingredientes do gás Sarin através da Turquia para a Síria, realizada pelo ISIL, "com o qual milhares de crianças foram assassinadas no Médio Oriente". Referindo-se à investigação e à acusação conduzidas pelo escritório de um promotor público em Adana, salientou: "Certos elementos na Turquia contactaram membros da organização terrorista ISIL e transferiram a matéria-prima do gás Sarin, que é uma arma química, para a Síria. O promotor iniciou uma investigação sobre o caso. Os suspeitos que fizeram a transferência foram detidos e presos. Sob a ordem do promotor, os telefones de todos os suspeitos foram escutados, detalhes da escuta encontram-se no indiciamento... Porém, após uma semana, o caso foi arquivado, os suspeitos foram libertados e autorizados a deixarem a Turquia para atravessarem a fronteira rumo à Síria ".
Devido aos pronunciamentos proferidos no parlamento, Erdem tornou-se alvo de uma campanha difamatória, particularmente depois de conversar com a imprensa internacional. Em Dezembro de 2015, por exemplo, salientou à RT: "materiais para armas químicas foram trazidos para a Turquia e preparados em campos do ISIL na Síria, que naquela época era conhecido como a Al-Qaeda iraquiana."
Ao criticar duramente Erdem pela entrevista à RT, Erdogan realçou que Erdem "atingiu o fundo do poço da traição" e pediu ao CHP que o exonerasse: "vergonha para o seu partido, para mim e para a minha nação deixá-lo continuar como membro do partido." Uma investigação sobre a traição foi iniciada contra Erdem.
Erdem então declarou que após a publicação da entrevista, recebeu ameaças de morte nas redes sociais, o seu endereço residencial foi postado por usuários pró-governo no Twitter, ao que tudo indica, para viabilizar um ataque à sua residência"Acabei de partilhar o conteúdo da acusação com o povo... Providenciei um documento... O governo está a realizar uma campanha de linchamento contra mim. Está alvoroçado por conta das minhas denúncias. Expus a sujeira e a manipulação da religião empreendida pelo governo nos meus livros... Recebi mais de mil ameaças de morte. A caixa de entrada do meu e-mail está lotada de ameaças de morte... Se algo acontecer comigo, os média pró-governo e os deputados da AKP serão os responsáveis."
Irredutível diante da pressão e das ameaças, Erdem continuou a expor e a falar sobre as actividades de grupos terroristas jihadistas na região. Num discurso no parlamento da Turquia em Junho de 2016, por exemplo, Erdem criticou mais uma vez o governo por fazer vista grossa perante as actividades do ISIL: "o ISIL conta com células latentes na Turquia. Esses ninhos são monitorizados por autoridades estatais. As informações obtidas da monitorização dessas células confirmam que o ISIL é bem organizado na Turquia".
O suspeito número 1 do ataque terrorista perpetrado pelo ISIL em Ancara, salientou Erdem, é conhecido pelas iniciais I. B. (Ibrahim Bali) que "recrutou 1.800 terroristas para o ISIL, todos foram monitorizados por câmaras de segurança, contudo não foi realizada nenhuma operação policial nem militar... Onde estão as forças policiais? Eu identifiquei 10 mil endereços (de membros do ISIL) nesses documentos de investigação conduzidos por promotores e juízes... Porque não estão esses homens presos?"
Erdem também teceu comentários sobre a revista Konstantiniyye de língua turca publicada pelo ISIL na Internet : "O ISIL envia essas revistas às livrarias e aos seus ninhos. O governo sabe disso. Mas nenhuma operação militar nem policial foi realizada em nenhum lugar, nem mesmo na gráfica da revista."
Erdem então mostrou uma foto da interface do "banco de dados" criada pelo ISIL dos seus membros feridos e sendo tratados, afirmando que muitos terroristas do ISIL recebiam tratamento médico na Turquia. Também pediu ao parlamento que criasse uma comissão para investigar as actividades do ISIL na Turquia, mas o pedido foi rejeitado pelos votos do AKP, partido do governo. No dia seguinte, em entrevista colectiva à imprensa no parlamento da Turquia, Erdem salientou: "Se a comissão que propusemos fosse implantada, teríamos acabado com todas as células do ISIL na Turquia em poucos meses. Não sobraria nenhuma, porque conhecemos os endereços dessas células. Sabemos dos endereços via informações da polícia... Também sabemos da investigação, por intermédio da polícia, que os membros do ISIL se organizam em Istambul por meio de uma revista chamada "O Mundo Islâmico". Mas não houve nenhuma operação policial contra eles. Isso não é negligência. Isso é cooperação (com o ISIL)."
Erdem também salientou que recebeu ameaças e insultos nas redes sociais por propor a criação de uma comissão para investigar o ISIL. Acrescentou que foi autorizada, pelo governador, a sua protecção por guardas de segurança como medida de precaução devido às ameaças de morte.
Em Maio de 2018, uma associação islamista exigiu que promotores emitissem um mandado de prisão contra Erdem. Respondeu que estava "a ser exposto a mais uma campanha de linchamento". Recebeu então a proibição de ir para o exterior quando estava prestes a deixar a Turquia rumo à Alemanha com a família em 21 de Maio. Foi impedido de embarcar no aeroporto de Istambul pelas autoridades e o seu passaporte foi confiscado.
O partido de Erdem, CHP, não o indicou a candidato ao Parlamento para as eleições de 24 de Junho, consequentemente ele perdeu a sua cadeira de parlamentar e a sua imunidade. Em 26 de Junho foi preso em Istambul.
A organização terrorista à qual o indiciamento de Erdem se refere é a FETÖ (Organização Terrorista Fethullah), nome dado em homenagem ao clérigo islâmico Fethullah Gülen. Trata-se de uma organização que Erdogan e outros membros do governo turco acusam de conduzir uma tentativa de golpe em 2016 e que costumam usar como pretexto para prender aqueles que os criticam.
Foi ingressada uma acção na justiça contra Erdem devido aos seus trabalhos no jornal Karşı, onde Erdem era o redactor-chefe. A acusação de que ele é um "defensor da FETÖ" não tem fundamento, já que em 2016 ele publicou um livro intitulado "Nurjuvazi" no qual ele critica Gülen e seu movimento.
Enquanto isso, um ex-deputado do CHP anunciou em 3 de Julho que os deputados do CHP que queriam visitar Erdem na prisão não tiveram autorização das autoridades. "Isto", escreveu ele no Twitter, "é o isolamento de Erdem".
Outra investigação foi recentemente iniciada contra ele, que investiga as suas críticas ao Exército Livre da Síria (FSA), por supostamente violar o artigo 301 do Código Penal, que determina os termos de prisão por "denegrir a Turquia, a Nação Turca e instituições governamentais turcas".
Num pesadelo orweliano, um ex-deputado e jornalista que de maneira tão corajosa dedicou a sua carreira para expor e condenar organizações terroristas, agora está a ser acusado de "ajudar terroristas". Os verdadeiros terroristas que ele condena, no entanto, permanecem em liberdade.
Erdem está a pagar o preço de dizer a verdade na Turquia. Arriscou a sua própria vida para dar um basta ao ISIL e ajudar a salvar vidas. Chegou a hora dos activistas de direitos humanos e dos médias defendê-lo.
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Uzay Bulut, jornalista da Turquia, é Ilustre Colaboradora Sénior do Gatestone Institute. Está actualmente radicada em Washington D.C.
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Fonte: https://pt.gatestoneinstitute.org/12791/turquia-terrorismo-denunciantes