ACERCA DO GRAU DE COMUNIDADE/NAÇÃO DOS LUSITANOS

(...) Os Lusitanos não constituíram um Estado no sentido clássico que o termo comporta. Formavam uma Comunidade. Em termos políticos actuais a comunidade corresponde à Nação; a sociedade corresponde ao Estado. A comunidade, historicamente, é anterior ao Estado.

O indivíduo nasce integrado numa comunidade. A comunidade é o grupo natural, o grupo primário, em íntima conexão com a vida rural ou campestre, enquanto que o Estado corresponde a uma desintegração das pequenas comunidades primárias, na sua passagem para um estado mais complexo e artificial das relações humanas. O Estado nasce de um estatuto mais amplo do que o da comunidade. No Estado o estatuto resulta de uma sociedade mais ampla, fruto de um convénio entre os grupos desarreigados.

A comunidade oferece sólidos e íntimos laços de afinidade entre os membros do grupo, que se podem traduzir em actos mais solidários e emocionalmente mais sentidos. A Sociedade não tem esse poder integrador.

(...) As grandes civilizações actuais, fortemente industrializadas, conduzidas quer por regimes de socialismo científico, quer por organizações sindicalistas, ou por grandes trusts, dão-nos imagens contraditórias de conduta humana. Quanto mais colectivizada é a vida social mais a pessoa se sente isolada, mais estreitas são as relações sociais fora do trabalho e da economia. A própria família se reduz ao núcleo primário.

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O conceito comunidade (nação) será o que mais convém à classificação das gentilidades lusitanas antes do domínio romano. Essas comunidades receberam o estatuto de província e pouco a pouco foram integradas no Estado Romano. As invasões dos Bárbaros e a expansão muçulmana deram à evolução das sociedades hispânicas formas de reinos diferenciados, que, com a Reconquista, voltaram a integrar-se no sistema clássico de Estado. O Estado surge, então, como a objectivação forte e concentrada do direito nascido espontaneamente da vida dos agrupamentos organizados, conforme a definição de G. Gurvitch. O sentimento de liberdade, que toma expressão com Afonso Henriques e com os barões que o acompanham, tem paralelo na aspiração de liberdade pessoal e colectiva que defendiam os pastores-guerreiros-patriarcas lusitanos.

In «Os Lusitanos - Mito e Realidade», de Adriano Vasco Rodrigues, editado pela Academia Internacional da Cultura Portuguesa, 1998, págs. 322 a 324.