SOBRE A EVENTUAL INFLUÊNCIA DO SANGUE NA DEFINIÇÃO DE PORTUGAL - I

De um pequeno fascículo datado de 1883 e intitulado «As Raças Historicas na Lusitania», parte da Bibliotheca do Povo e das Escolas:

«(...) E a respeito da luta de Ordonho contra Mohammed, cujos estados foram invadidos até Lisboa por aquele, que se aproveitara das discórdias dos muçulmanos, diz o mesmo escritor [Alexandre Herculano]: "Estas lutas pequenas eram inevitáveis na Espanha muçulmana, onde à falta de instituições políticas assaz robusta para manterem a unidade social se ajuntavam as mútuas repugnâncias nascidas da diversidade de raças, não só entre Árabes e Berberes, mas também entre uns e outros e os Moçárabes cristãos, inimigos naturais daquelas duas categorias de conquistadores, de quem os separava a diversidade de origem e de crença e a sujeição de povos conquistados."
(...) O predomínio das raças é a grande barreira das grandes nacionalidades. O que o poder das armas não pode obter, obtém-no o poder do sangue, mais forte do que elas e a vontade dos homens.
A separação da Hispânia em províncias independentesm, conforme as raças que as povoam, começou já a operar-se no tempo dos Árabes! Isto é muito importante, para explicar a facilidade com que os reis de Leão, e mais tarde o conde D. Henrique e seu filho, invadiram e tomaram as terras ocupadas pelos Árabes e Mouros.
(...)
Os dialectos galego, asturiano ou leonez, foram dos que mais se isentaram do senhorio da língua sarracena, mantendo-se com mais pureza e menos corrupção, ainda que com um som diferente e pronunciação diversa das mais províncias cristãs, o que procedeu de que os Árabes nunca fizeram assento fixo nas terras da Galiza e das Astúrias, porque nunca as puderam subjugar. Nesses dialectos do norte não há o gutural do meio-dia e que não se encontra também no Português!
Quanto a isto, Ribeiro dos Santos divide-os em dois dialectos: o do norte, conservando-se mais puro do arabismo, e o das províncias do meio-dia em que dominou mais o árabe. A distinção, porém, não é tão brusca.
Na língua primitiva portuguesa, encontram-se vários dialectos, a dar crédito aos vários monumentos literários que felizmente nos restam dessa época.
O Cancioneiro do Colégio dos Nobres, a canção de Gonçalo Hermingues, a canção do Figueiral, o Bernal Francês e o poema da Cava, não oferecem idêntico Português.
O que é fora de toda a dúvida é que, à medida que a nossa língua se ia desenvolvendo, ia abandonando as reminiscências arábicas e aproximando-se das línguas do norte!
(...)