OPINIÃO DUM CELTO-ROMANO PAGÃO SOBRE OS CRISTÃOS E OS JUDEUS NA ANTIGUIDADE TARDIA

Deste valioso site, e doutros, retira-se o seguinte sobre as impressões dum aristocrata erudito e viajante galo-romano (isto é, celta gaulês romanizado, ou eventualmente um filho de Gauleses e de Romanos) Rutílio Namaciano a respeito dos judeus e dos cristãos:

Rutilio Namaciano viveu entre os séculos IV e V d.c.. Nasceu em Tolouse; o seu pai, Lacânio, era um galo-romano de tal modo importante que chegou a exercer o cargo de prefeito da cidade de Roma.
Quando jovem, estudou Direito e Literatura em Roma; na idade adulta, foi, tal como o pai, prefeito de Roma (413 ou 414 d.c.).
Nesta época, o culto aos Deuses e espíritos ancestrais tinha já sido proibido (Édito de Tessalónica de 380); todavia, muitos romanos de boa cepa, quer das recônditas aldeias, quer da aristocracia e da elite intelectual urbana, mantinham-se leais à religião nacional, herança dos seus antepassados, isto é, aquilo a que se chama Paganismo. Rutílio Namaciano, intelectual aristocrata de raízes célticas, estava entre estes nobres que resistiam à imposição da Cristandade e constituiam o último baluarte da fidelidade aos Deuses e aos espíritos da sua Estirpe.

Chegaram aos dias de hoje excertos do seu «De Reditu Suo» (O Retorno), diário duma viagem feita pelo autor, por via marítima, de Roma a Tolouse, na Gália meridional, terra dos seus pais.
«De Reditu Suo» é composta por duas partes, embora a segunda se encontre actualmente quase totalmente mutilada.

Ao longo de várias peripécias de viagem, Namaciano vai dando as suas impressões sobre o que vê e o que pensa. Algumas delas dizem respeito ao Cristianismo e ao Judaísmo, credos estes que muitos dos pagãos desta época consideravam como causas da ruína do Império Romano. Numa época em que as terras da Romanidade estavam semi-ocupadas por bárbaros recentemente chegados de além «limes» (fronteira), e afectadas por graves desequilíbrios sociais provocados pelos desmandos da Igreja, dos grandes proprietários e dos imperadores cristãos, nesta época, dizia-se, os últimos pagãos recordavam com saudade os dias felizes do Império, quando Júpiter e os Outros Deuses ofereciam a prosperidade às gentes, sob a afortunada «Pax Deorum» (Paz dos Deuses - Harmonia dos homens com as Deidades).

Depois de desembarcar em Falésia, Itália, com os seus acompanhantes, e de dirigir-se a uma pousada para descansar a meio da viagem, Namaciano aproveita o procedimento hostil do estalajadeiro judeu para expor o seu ponto de vista sobre o povo judaico:
«... passeámo-nos por um bosque; fomos seduzidos por lagos deliciosos de águas bem cercadas. A grande extensão de água ali encerrada permite que os peixes saltitem alegremente nestes viveiros. Mas o estalajadeiro, mais áspero como anfitrião do que Antífates, fez-nos pagar caro o reposo nesta amena paragem. Com efeito, este lugar era regido por um irritável judeu - uma criatura incompatível com boa comida humana (alusão à abstinência de porco por parte dos Judeus, que o consideram como impuro, postura que os Romanos não compreendiam, visto que tinham cinquenta maneiras diferentes de cozinhar carne de porco). Cobrou-nos por termos danificado os seus arbustos e pisado umas algas e pôs-se a gritar que derramámos água, causando-lhe graves prejuízos. Devolvemos os insultos apropriados a esta raça súcia que desavergonhadamente corta o prepúcio; são uma origem de insensatez; dentro do coração têm os seus frios sábates (festa judaica, celebrada ao sábado), mas o seu coração é ainda mais frio do que a sua religião. Um em cada sete dias é por eles condenado a uma vergonhosa letargia, à imagem débil do seu Deus cansado. Quanto aos restantes disparates desta corja de escravos mentirosos, opino que nem uma criança neles acreditaria se com eles sonhasse. Era bom que a Judeia nunca tivesse sido submetida pelas armas de Pompeu e pelo poder militar de Tito (imperador romano que venceu e subjugou os Judeus em Jerusalém), pois o contágio desta peste, ainda que se extirpe, expande-se mais e mais, e assim uma nação vencida degrada os seus vencedores.»

Ao continuar a sua viagem, passa pela ilha de Caprária e comenta a respeito duma comunidade de monges cristãos que aí se encontram em reclusão:
«Navegámos ao largo da costa e foi aqui que Caprária surgiu diante de nós. A ilha está cheia desses homens que fogem da luz. O nome com que se designam a si mesmos é de origem grega, «monges» (monakoi), porque querem viver sós. Receiam os dons da fortuna, pois temem os seus revezes: mas será que alguém, para escapar à miséria, escolheria viver na miséria? Que fanatismo imbecil é este, dum cérebro distorcido, incapazes sequer de aceitar as coisas boas por causa do seu terror das más? Ou são como prisioneiros que exigem a punição apropriada pelas suas acções, ou os seus corações melancólicos estão comidos pela bílis negra, pois que até Homero atribuiu à bílis o tormento da alma de Belerofonte, o qual, ao ser acometido por uma dor horrenda, sentiu aversão pelo género humano.»

Noutro momento da viagem, Rutílio Namaciano recorda o caso dum jovem que se encerrou numa ilha perto da Córsega, levando uma vida solitária e anti-social:
«aqui se sepultou em vida um concidadão, nosso até há pouco tempo (talvez seja «pagão até há pouco tempo»), este jovem de ilustres antepassados, em nada inferior em bens ou em matrimónio, que, impelido pelas Fúrias, abandonou homens e terras e vive na superstição (alusão ao Cristianismo?), desterrado em vil esconderijo. Crê o infeliz que o divino se alimenta da sua imundice e assim tortura-se com maior crueldade do que fariam os Deuses ofendidos. Acaso não será pior, pergunto eu, esta seita (o Cristianismo?) do que os venenos de Circe (maga que transformou os companheiros de Ulisses em porcos)? Circe transformava corpos, agora transformam-se almas.»

Pode ler-se o texto integral aqui, em Inglês; para quem quiser ler em Latim latinos, há esta página.

A entrada do Wikipédia sobre o autor está bastante boa e faz por explicar, convincentemente, o que quer Namaciano dizer com estas afirmações: não queria melindrar os seus colegas políticos que era cristãos mas patriotas, pelo que em vez de atacar directamente os cristãos, refere-se apenas aos monges; mas, ao mesmo tempo, percebe-se que o seu maior ódio ao Judaísmo reside no facto de esta religião semita ter originado o Cristianismo.
Namaciano é pois um pagão romano à maneira clássica, pois que louva o esplendor da Natureza e a grandeza da sua Pátria romana, enraizada nos Deuses, dando entretanto a ideia de que, a seu ver, tudo o que está fora do Paganismo antigo é mera barbárie.