quarta-feira, março 06, 2019

SOBRE O SUBSTRATO DAS LÍNGUAS LATINAS HISPÂNICAS

Os contributos pré-romanos para as línguas hispânicas latinas (a conquista romana e a romanização começa no século III a.c. e não se completa antes do século I a.c., nalgumas zonas com pouca efectividade) são correspondentes às línguas dos Povos indígenas da Península Ibérica:
 - Celtas na Meseta Ibérica, no norte e no oeste (indo-europeus); 
 - Íberos na zona este e sul (aparentemente não indo-europeus);
 - Celtíberos na zona intermédia (Celtas da Ibéria ou talvez fusão de Celtas com Íberos, mas falantes de idioma céltico, portanto, indo-europeu);
 - Tartéssios na zona do sudoeste (proveniência desconhecida, talvez indo-europeia);
 - os falantes do idioma basco (que não é indo-europeu e que pode estar relacionado com as línguas iberas, não com as célticas); 
 - Cartagineses e Fenícios (língua semita);
 - Gregos (indo-europeus).

Desta remota época, sobreviveram provavelmente elementos tais como:
 - a lenição das oclusivas surdas intervocálicas para sonoras: as -p-, -t-, -k- transformam-se em -b-, -d-, -g-. Alguns autores relacionam-no com substrato céltico (cfr. galês *blatu > blawd ‘flor’, *balleko > balleg ‘saco’). Entre os romances hispânicos (Romance: latim medieval, evolução na Europa da Antiguidade tardia do latim vulgar), unicamente  o Moçárabe resistiu à lenição: ficaira ‘figueira’ < ficaria.
 - a fricativização do grupo dy > z: gaudium > ‘gozo’. Alguns autores consideram-no resultado de um substrato céltico; constata-se em Celtibérico ozas < *(p)odians 'pés', zoelae < *diovelae < *dyew-el-ai.
 - a antecipação do yod: ‘couro’ < cuiro < corium, ‘Douro’ < duiro < Durius. Alguns autores o relacionam-no com um substrato céltico (cfr. irlandês cuire < *corio ‘exército’). Acrescento: latim contrarius > Português medieval «contrairo».
 - a assimilação do grupo n'm > lm: ‘alma’ < an'ma < anima. Alguns autores relacionam-no com um substrato céltico; constata-se em Celtibérico: melmu < *men-mōn ‘inteligência’.
 - a inserção de /b/ para realização do grupo m'r: ‘cambra’ < cam'ra < câmara. Já se regista no antigo hispano e para alguns autores pode ter relação com um substrato céltico (cfr. Sambrucela < *sam'ruocela < *sámaro-ocela 'a colina do [río] Sámaro’).
 - o sufixo diminutivo -ino, -ina. É especialmente frequente no Galaico-Português -iño/inho, -iña/inha (Tomasiño) e no Asturo-Leonês -ín, -ina (Tomasín); também aparece ocasionalmente em Castelhano. Procurou-se uma relação deste sufixo com um substrato céltico, já que corresponde exactamente com o diminutivo usado em Irlandês -in, -ine (Tómasín ‘Tomasito’, capaillín ‘cavalito’, cfr. Asturo-Leonês caballín) y galês -yn, -en (pysgodyn ‘peixinho’).
 - a divisão do conceito ‘existir’ em dois verbos: ser e estar. O primeiro evoca permanência e, o segundo, transitoriedade: é um homem, está cansado. Alguns autores relacionam-no com um substrato céltico; tal como diversas línguas romances, o Irlandês mantém a mesma distinção: is fear é ‘é homem ele’, tá sé tuirseach ‘está ele cansado’.
 - a desaparição do f- inicial em muitas palavras que em Latim têm este som, e, supostamente, o betacismo, devidos, provavelmente, à influência do idioma basco ou do idioma ibero (note-se que a aspiração do /h/ também se dá no Gascão [sudoeste de França], que terá tido igualmente um substrato basco);
 - alguns sufixos, como -aga, -ago, -erri, -rro, -rra, -occus (sobreiro);
 - numerosos topónimos; entre os de origem céltica destacam-se os que têm o sufixo -briga, que significa ‘lugar alto’ (Flaviobriga o Segobriga —também como raiz, em Bergantiños o Brihuega—) ou a raiz sega, que significa ‘vitória’ (Segóvia ou Sigüenza); pelo contrário, as etimologias dos corónimos peninsulares são assuntos muito debatidos, ainda que Hispânia pareça provir dos Povos colonizadores (‘costa norte’ em Fenício-Cartaginês) e Ibéria dos indígenas (‘rio’, seja o hidrónimo ibérico genérico ou o Iber, ao qual hoje chamamos Ebro);
 - palavras de provável origem céltica, como bétula, álamo, aliso (amieiro), amelga (palavra castelhana), balsa, varanda, varrendo, beleño (meimendro?, beladona?), berro, berrueco (penhasco), cantiga, colmeia, estancar, gancho, garça, gorar, lança, légamo (lodo), losa, olca (?), páramo, robalo, tarugo, trançar, virar, inclusivamente algumas que parecem propriamente latinas, como porco e toiro (que já estão na inscrição de Cabeço das Fráguas como porcom e taurom), e outras que se incorporaram no Latim a partir de outras línguas célticas não hispânicas e logo se incorporaram no Hispânico tais como braga, cabana, camisa, cerveja, légua;​
 - palavras de provável origem ibérica, como barranco, rasca, gândara, lama e outras incorporadas no Latim mas de origem ibérica, como estepe, galena, mínio, sobral; algumas das quais são nas próprias fontes romanas identificadas como ibéricas, tais como arroio, coscojo e gordo;
 - palavras de provável origem basca, como aquelarre, cencerro (chocalho), chamarra (jaqueta), chaparro, gabarra (barcaça), esquerda, laia, narria (diversos significados em Castelhano, inexistente em Português), órdago (inexistente em Português), pizarra (ardósia), socarrar (estorricar), samarra, Zumaia;
 - palavras de provável origem cartaginesa, como tamujo;
 - palavras das quais não se estabeleceu com precisão a origem ou pertença aos diversos grupos de línguas pré-romanas ibéricas, como abarca, artiga (urtiga?), aulaga (tojo), barda, barraca, barro, bezerro, cama, camorra (briga?), caspa, galápago, gaspacho, mogote, perro, sapo, sarna, silo, toca, veiga.​
*
Fonte: adaptado de https://es.wikipedia.org/wiki/Historia_del_idioma_espa%C3%B1ol

2 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Interessante. Caturo já viste o novo mapa genético da Europa, mostra as relações e as proximidades

https://3.bp.blogspot.com/-YMii4ZFFx7k/W55QUJB-L7I/AAAAAAAAHN4/ZANhxNSOhssU6hiWO39rSJziehTKu2uXACLcBGAs/s1600/Celto-Germanic_PCA.png

http://eurogenes.blogspot.com/2018/09/celtic-vs-germanic-europe.html


Não era a esquerda e os imigrantes que diziam que os portugueses e os espanhois não eram europeus-brancos. ahah somos e bem

7 de março de 2019 às 14:08:00 WET  
Blogger Caturo said...

Mapas interessantes, sem dúvida, que confirmam o que já se sabia - a maior diferença na Europa é entre o norte e o sul, seguida do leste para o oeste, estando os Célticos numa ponta, os Eslavos na outra e os Germânicos no meio, enquanto os Latinos do sudoeste formam outro sub-conjunto. A proximidade entre todos os Europeus, na generalidade, permanece.

8 de março de 2019 às 01:36:00 WET  

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