GOVERNO ITALIANO PRÓ-UE DERROTADO EM REFERENDO - PRIMEIRO-MINISTRO DEMITE-SE
Primeiro-ministro italiano tinha prometido deixar o cargo se italianos dissessem Não à reforma constitucional que defendeu.
"Vamos embora sem remorsos. A experiência do meu governo termina aqui", afirmou Matteo Renzi numa intervenção ao povo italiano a partir do Palácio Chigi depois da vitória do Não no referendo constitucional.
"Digo aos amigos do Sim que fui eu que perdi eu e não vocês. Assumo toda a responsabilidade", afirmou o primeiro-ministro italiano, antes de acrescentar que, no entanto, "quem luta por uma ideia nunca perde". Recordando que Itália "é o país mais belo do mundo. Esta é a bandeira mais bela do mundo", pediu para limparem as lágrimas porque no futuro hão-de vencer.
Antes de agradecer à mulher, Agnese e aos filhos, Renzi lembrou ainda que "podemos perder mas não podemos perder o sentido de humor".
O primeiro-ministro demissionário disse ainda que entregará a demissão amanhã à tarde ao presidente Sergio Mattarella. Na política ninguém perde, mas eu sou diferente. Perdi e digo-o em voz alta, ainda com um nó na garganta. Não sou um robô, sou um humano", afirmou, emocionado.
Renzi deixou ainda um abraço e um beijo ao seu sucessor. "Nos mil dias e mil noites que passei neste palácio, vi a oportunidade de mudar para uma democracia mais directa. Mas essa não foi a vontade do Povo Italiano", disse ainda Renzi, afirmando "continuar a acreditar na Itália".
Com metade das assembleias de voto contadas, o Não estava à frente com 59,64% dos votos, contra 40,36% para o Sim, determinando que a reforma constitucional defendida pelo primeiro-ministro Renzi não avança.
"Aos amigos do Sim", o primeiro-ministro quis deixar um "abraço forte". Renzi lamentou que não tenham conseguido levar aos Italianos esta oportunidade de mudança.
No poder desde Fevereiro de 2014, Renzi, de 41 anos, prometera demitir-se em caso de vitória do Não, tendo depois recuado, reconhecendo que era um erro personalizar um escrutínio que aos poucos acabou, no entanto, por se transformar num plebiscito à sua governação.
Reforma constitucional
Com esta reforma, o primeiro-ministro esperava reduzir os poderes do Senado (actualmente o sistema italiano é um bicameralismo perfeito, no qual senadores e deputados têm a mesma força), além de acabar com a sobreposição de poderes a nível regional. Mas, para muitos eleitores, transformou-se num plebiscito ao governo de Renzi, especialmente depois de o próprio dizer que se demitiria em caso de derrota. Toda a oposição (e alguns membros do próprio partido) estava contra a reforma.
A demissão de Renzi e a incerteza política que esta supõe é o pior cenário para a Europa, que além do contágio económico teme que a eventual realização de novas eleições possa significar a vitória dos populismos em Itália - não só o Movimento 5 Estrelas do ex-humorista Beppe Grillo (que defende um referendo para a saída do euro), mas também a Liga Norte (anti-imigração e antieuropeu). "Os italianos repudiaram a UE e Renzi. É preciso escutar esta sede de liberdade das nações", escreveu a líder da Frente Nacional francesa, Marine Le Pen.
A economia italiana parece parada há 20 anos, com o desemprego nos 11,6 % (36,4% entre os jovens) e uma dívida pública de 2,2 biliões de euros (132,7% do PIB), só menor que a grega. As previsões de crescimento para 2016, da OCDE, são de apenas 0,8%. Apesar de o ministro da Economia italiano, Pier Carlo Padoan, afastar qualquer hipótese de "terramoto financeiro" depois do referendo, a verdade é que a taxa de juro da dívida subiram nas últimas semanas e existe uma preocupação crescente em relação aos créditos de cobrança duvidosa, que ensombram a banca italiana.
Elevada participação
Na campanha, Renzi mostrou-se convencido de que com uma participação acima dos 60% teria garantida a vitória e, desde os primeiros dados, esse valor apresentava-se como favorável ao primeiro-ministro. Ao meio-dia (11.00 em Lisboa) esta era já de 21%, mais dez pontos percentuais do que no referendo constitucional de 2006 (no qual venceu o não). E às 19.00 ultrapassava os 57%, muito acima dos 42% registados nas eleições europeias de 2014, nas quais o Partido Democrático de Renzi conseguiu o melhor resultado de qualquer formação a nível nacional desde as eleições de 1958. No final, ficaria nos 69,11%.
O primeiro-ministro também apostava numa menor participação no Sul, onde alegadamente existe maior resistência à mudança, e os números apontavam nesse sentido. A participação nessa região era de 47,2% às 19.00, mas o problema é que era muito mais elevada a norte (62,8%), onde se concentram muitos eleitores da Liga Norte (Extrema-Direita) e da Forza Itália, do ex-primeiro-ministro Silvio Berlusconi. No centro, a participação era de 58,6%.
A votação, que começou às 07.00 locais e só acabou às 23.00 (menos uma hora em Lisboa), não decorreu sem problemas. Nas redes sociais, alguns eleitores queixaram-se de que o lápis com que votaram podia ser apagado dos boletins, com o Ministério do Interior italiano a responder que os 130 mil lápis distribuídos pelas assembleias de voto eram indeléveis.
Mais insólita foi a polémica em torno do voto do primeiro-ministro. Os eleitores têm de mostrar uma identificação válida e Renzi esqueceu-se da sua. Contudo, foi autorizado a votar. "Eu não tenho documento, mas espero ser reconhecido", disse ao votar em Pontassieve, na província de Florença. O chefe de governo votou ao lado da mulher e dos três filhos.
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Fonte: http://www.dn.pt/mundo/interior/renzi-anuncia-demissao-apos-derrota-no-referendo-5534402.html
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