domingo, novembro 23, 2014

SOBRE A GRANDE CAUSA DO SUCESSO DO UKIP - A VOZ (POSSÍVEL) DA IDENTIDADE NACIONAL

Fonte: http://www.standard.co.uk/comment/comment/matthew-goodwin-ukips-not-going-away--its-roots-lie-in-a-deep-divide-in-our-society-9875665.html
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Um artigo com o seu interesse, este, da autoria de Matthew Goodwin, professor de Política na Universidade de Nottingham e co-autor do livro «Revolt on the Right: Explaining Public Support for the Radical Right in Britain» (Routledge), ou «Revolta à Direita: Explicar o Apoio Público à Direita Radical na Grã-Bretanha». Goodwin analisa aqui a origem do sucesso do UKIP, Partido Independentista do Reino Unido, dirigido por Nigel Farage. Movimento insurgente que ganhou as eleições europeias em Maio deste ano, era-lhe vaticinado em Westminster uma queda em breve. Todavia as eleições legislativas viram reafirmada a sua pujança. O UKIP tem entretanto um doador multimilionário, o ex-conservador e agora deputado pelo UKIP Douglas Carswell. O partido tem agora mais de quarenta mil membros e, segundo as sondagens, quinze por cento do eleitorado.
Os bons resultados do UKIP sucedem-se - numa recente eleição local conseguiu ficar em primeiro lugar, batendo a tradicional oposição, a dos Trabalhistas, batendo até mesmo o Partido Conservador (o dos Tories), e isto numa região onde há muitos imigrantes, usualmente controlada pelos Trabalhistas.
O UKIP está a ganhar votos não apenas entre os eleitores desiludidos dos Tories, mas também nas classes trabalhadoras que costumavam apoiar os Trabalhistas: em Rochester, quarenta e quatro por cento dos que tinham votado nos Conservadores em 2010 planeavam votar no UKIP, também no UKIP votou quarenta por cento do eleitorado dos Trabalhistas e ainda vinte e três por cento dos eleitores dos Liberal-Democratas («Direita» liberal). É interessante que Goodwin diga que o UKIP já parece mais uma «vasta igreja» do que um partido conservador disfarçado...

E é interessante porque dá ideia de que Goodwin se apercebe que há aqui algo que vai além da simples política partidária - qualquer apelo popular que ultrapassa as partidarites.

E a seguir diz algo de especialmente significativo: «A inabilidade dos principais partidos para conter esta revolta reflecte em última análise um falhanço em entender a sua causa original. O UKIP não é guiado sobretudo por uma política de protesto. Nem se pode dizer que o partido seja um produto da crise financeira ou um repúdio de David Cameron. Em vez disso, o seu apelo está enraizado em divisões muito mais profundas da sociedade britânica que se fizeram sentir primeiro nos anos setenta e que têm vindo a aumentar desde então. Em suma, a transformação da Grã-Bretanha não afectou todos os grupos de igual maneira: alguns sentiram-se deixados para trás, à deriva e à margem do novo consenso do "mainstream"».

O UKIP é mais forte entre os idosos, a classe trabalhadora e os eleitores de raça branca que ganham cerca de £24,000 por ano, têm poucas qualificações, já estavam em apuros bem antes da crise e depois sofreram a pior parte da austeridade. Em assuntos económicos estão mais perto dos Trabalhistas que dos Conservadores: sentem que os trabalhadores comuns não estão a obter a sua parte justa e são abertamente hostis às grandes corporações. E não estão nada entusiasmados com a conversa robótica dos Conservadores sobre a retoma (onde é que eu já ouvi isto, digo eu, o blogueiro...).
Por isso o UKIP é agora o maior partido das classes trabalhadoras - tal como a FN em França, note-se. 
Estes eleitores, das classes baixas indígenas, não se preocupam apenas com o bolso. Goodwin diz até que se interessam tanto pelas questões culturais como pelas económicas. Não comungam portanto dos valores da elite, centrada em Londres, educada nas universidades. E isto já se sabe há muito, nomeadamente no que respeita à hostilidade instintiva desta população contra a imigração. Nigel Farage consegue mobilizar esta gente. Os políticos dos principais partidos tentam recuperar os votos perdidos para o UKIP. E tentam-no invocando motivos de ordem económica. Mas estes eleitores interessam-se menos por saber como é que os imigrantes ou a União Europeia contribuem para a riqueza britânica do que como é que a alteração social está a causar impacto no sistema de valores, no modo de vida e na identidade. As suas preocupações são difusas e abstractas e não se dá a volta a isso através de um discurso populista.

E termina assim, Goodwin, algo tecnocrático, talvez porque ele próprio o seja ou esteja simplesmente a dirigir-se a uma elite tecnocrática: «Não pensem no UKIP como um partido político. Pensem na sua revolta como um sintoma de conflitos muito mais profundos na Grã-Bretanha moderna: entre os que têm recursos para se adaptar à alteração social rápida e os que se sentem passados para trás.»

O autor volta destarte a pôr a tónica na questão da sobrevivência sócio-económica, depois todavia de ter aflorado o que realmente mais mobiliza a população que vota na dita «Extrema-Direita», consciente ou inconscientemente: uma repulsa instintiva - para usar um termo do próprio Goodwin - pela imigração e uma reacção de essência identitária, assumida com maior ou menor rigor.

Pouco importa que o UKIP seja realmente o melhor partido para levar avante esta reacção popular aos desmandos da elite reinante. Naturalmente que os nacionalistas mais coerentes e conscientes prefeririam que esta vaga fosse conduzida pelo BNP, ou pelos Democratas Ingleses (partido relativamente recente), ou pela nova formação partidária do ex-eurodeputado do BNP Andrew Brons, o BDP, mas isso é outra história. Os líderes podem ser substituídos a qualquer momento. Os partidos também, embora mais dificilmente. O que conta é, acima de tudo, o Movimento - a máquina nacionalista em movimento, que não pode parar. O seu combustível é o mais autêntico sentir popular, o mandamento vital de pôr os seus em primeiro lugar. A partir daí tudo o resto é secundário.