terça-feira, dezembro 29, 2009

CONTOS, MITOS E LENDAS DA BEIRA, CORAÇÃO DA ANTIGA LUSITÂNIA - VIII

Mais algumas narrativas, que o leitor Sérgio Esteves aqui deixou, pelo que lhe agradeço, aproveitando para chamar especial atenção às duas últimas deste tópico, cuja simplicidade popular não diminui o valor ético e até prático - respectivamente, o espírito de pagar para ver perante prosápias insustentadas e a independência individual de um modo que dir-se-ia moderno, contemporâneo até:

CONTO DO GROU
Era uma vez o conto do grou o rabo do conto logo se acabou.
Recolha efectuada em Penha Garcia - Concelho de Idanha a Nova

DONA ALINA E DOM FLORES
Dona Alina estava grávida e queria ter o filho em casa de sua mãe. O marido não concordava, mas ela, mesmo assim foi para casa da mãe. Quando o maridosoube disse:Altos, altos meus criados Meus cavalos a ferrar Vou ver D. Alina Que a quero ir matar. Quando chega à porta diz: Levanta-te ó D. Alina Se te queres levantar Se lá chego aí dentro Pelos cabelos te hei-de arrastar. A filha aflita diz para a mãe: Levante-se ó minha mãe Se se quer levantar Que está o D. Flores à porta Jura que me haverá de matar. Diz novamente D. Flores da porta: Levante-se ó D. Alina Se te queres levantar Se aí chego dentro Mesmo aí te hei-de matar.
Diz novamente a filha para a mãe: Levante-se ó minha mãe Se se quer levantar Dê-me cá o meu meninoQue também o quero levar. D. Flores atou D. Alina a uma corda e prendeu-a ao cavalo. Arrastou D. Alina esta a certa altura diz: Ollha pra trás ó D. FloresOlha para trás se queres olhar O cavalo era branco E já é do meu natural. O filho com três dias por milagre diz para o pai vendo a sua mãe quase morta: Olhe para trás ó meu pai Olhe para trás se quer olhar As florinhas do campo Por minha mãe a chorar. Ao ouvir isso diz D. Alina: Olha para trás ó D. Flores Olha para trás se queres olhar Que um menino de três dias Será milagre falar. Diz-lhe D. Flores: Fica aqui D. Alina Neste fresco areal Que eu vou chamar o padre Para que te venha confessar. Respondeu-lhe D. Alina:Pois aqui é que eu não fico Neste fresco areal Leva-me àquela ermida Que além está a branquear.
Que bicuda a tua espada Minha cova abrirás E com as patas do teu cavalo Minha terra patearás. Aqui tens o meu meninoNão o dês à tua mãe Que ela o irá matar Entrega-o à minha mãe, Que ela o saberá criar.A irmã de D. Alina vingando-se da morte da irmã diz para D. Flores quando chega a casa: Senta-te aqui ó D. FloresQue vens cansado do caminho Senta-te aqui nesta cadeira E bebe este copo de vinho. D. Flores: Que fizeste tu ao copo Que deitas-te tu no vinho Eu tinha a rédea na mão E já não vejo o cavalinho. A irmã de D. Alina respondeu-lhe: Deitei-lhe pós de lagartoDeitei-lhe pós de lagartoDaquele que era mais fininho. Recolha efectuada em Penha Garcia - Concelho de Idanha a Nova

OS TRÊS HERDEIROS
Era uma vez um homem que tinha três filhos. Quando chegou a hora da sua morte chamou-os e disse-lhes: -Filhos eu estou a morrer, mas o que me custa mais é deixar-vos tão pobres,pois não tenho mais nada para vos deixar senão uma foice, um gato e um galo. Quando o pai morreu o filho mais velho ficou com a foice, o do meio com o galo eo mais novo com o gato. Decidiram então correr o mundo. Um dia o mais velhopassando por um campo de trigo viu os ceifadores a ceifar o trigo com facas edisse-lhes: -Então vocês andam ainda a ceifar o trigo com isso? Eu trago aqui um bichinho que ceifa tudo num instante. Ceifou um pouco de trigo coma a foice, as pessoas admiradas com a rapidez do bichinho perguntaram-lhe quanto queria por ele. O rapaz pediu-lhes muito dinheiro, mas as pessoas precisavam dele deram-lho. Os ceifadores não sabiam ceifar com ele e o primeiro que o experimentou cortou-se e disse: -Ai raio do bicho já me mordeu! Atiroua foice para o meio do trigo as outras pessoas ao verem aquilo e a ferida do companheiro, começaram a atirar àfoice, esta aquando as pedras lhe caiam em cima fazia: -ZIM, ZIM, ZIM......... -Atirem mais que está assanhado. – Diziam uns para os outros. E assim continuaram a ceifar com facas. O filho do meio, certo dia, muito cedo, encontrou uns homens com carros de bois edisse-lhes: -Então onde vão tão cedo com os caros de bois?-Olha vamos buscar a manhã; todos os dias nos levantamos cedo e vamosbuscar a manhã. -Eu tenho aqui um bichinho que lhes poupa todo esse trabalho, todos os dias chama a manhã. -Então quanto quer pelo bichinho? – perguntaram os homens. O rapaz pediumuito dinheiro, mas deram-lho. Todos os dias o galo cantava: -CO-CO-RO-CO-CO e amanhecia.
O filho mais novo, certo dia passou por uma cidade onde havia muitos ratos. As pessoas andavam com grandes varapaus a matá-los, mas por mais que matassem não conseguiam acabar com ele. Quando viu isto disse para as pessoas: -Vocês andam aí com tanto trabalho a caçar ratos com paus, eu tenho aqui um bichinho dentro desta saca que os comeria todos, - e deitou-o fora um bocadinho. Este ao apanhar-se cá fora começa logo a comer neles. As pessoas assim que viram isto perguntaram-lhe logo: -Quanto quer pelo bichinho? O rapaz pediu muito dinheiro. Deram-lho e pôs-se a caminho. Quando lá ia longeas pessoas lembraram-se que não tinham perguntado o que o bichinho comia ecomeçaram todos a chamá-lo perguntado: -Olhe lá o que come o bichinho? Ele responde: -Do que a gente come. Como já ia longe eles perceberam: -Muita gente come. Começaram então todos à pancada no gato até que o mataram. Assim ficaram de novo com muitos ratos na cidade. Os três irmãos que apenas tinham herdado a foice, o galo e o gato ficaram ricos e viveram felizes.
Recolha efectuada em Penha Garcia - Concelho de Idanha a Nova

A ÁGUIA E A RAPOSA
Era uma vez uma águia uma raposa que eram comadres. Um dia a águia convidou a raposa para ir a uma boda ao céu; a raposa respondeu: -Eu gostava d’ir comadre mas não posso. -Não faz mal, anda qu’eu levo-te nas unhas. Foram as duas. A raposa ia nas unhas da águia e quando lá iam no alto diz aáguia para a raposa: -Segura-te comadre que eu quero cuspir nas unhas. Quando disse isto largou a raposa. Esta quando vinha no ar dizia pa ma lage: -Foge lage que te parto qu’eu vanho do céu, se escapar desta já no volto bodas no céu. Recolha efectuada em Penha Garcia - Concelho de Idanha a NovaA MENINA E A ÁGUIAAntigamente houve uma menina que foi deixada no meio da floresta. Veio umaáguia e levou-a para uma rocha, para o seu ninho e criou-a. E ela fez-se uma linda donzela. Certo dia um Principe foi para aquela zona caçar. Ao ver aquela linda donzela quis mostrá-la aos pais. Ela já tinha noiva mas mesmo assim pediu aos pais que lhadeixassem apresentar. Os pais deram-lhe permissão e quando ele já levava a raparigapara o Castelo aparece-lhes a mãe águia que lhe diz: -Ah! Velhaca já lá vais. Deixa lá que em cara de cabra te faças. Assim aconteceu, mas o Principe não desanimou porque sabia a cara que ela tinha eo que se tinha passado. Chegando ao Castelo, os pais lá tiveram de a aceitar edisseram às duas noivas do Principe que a que fizesse o vestido mais bonitocasava com o seu filho. Fecharam-nas cada uma em seu quarto e deixaram-nas sózinhas. A rapariga toda preocupada pois nunca tinha feito nada, nem sabia fazer nada chamou pla sua mãe águia. Ela apareceu-lhe então e ensinou-lhe a fazer o vestido. Quando foram apresentar os vestidos, os Reis ficaram espantados com o vestido da rapariga da rocha, porque ganhava ao da outra. Ainda não convencidos os Reis disseram:-Agora a que fizer melhor come é a que casa com o meu filho. A rapariga aflitachamou pela sua mãe águia que lho ensinou a fazer. No fim a mãe águiadisse-lhe que quando estivesse a comer para meter todos os ossinhos para a manga do casaco. Quando provaram o comer os Reis ainda ficaram maisadmirados com a rapariga da rocha, porque ganhava ao da outra. Quandoestavam a comer a rapariga fez o que mãe lhe tinha mandado: começou a ditar ossinhos para a manga do casaco. A outra ao ver aquilo encheu-lhe a barriga de porca mal ajeitada, mal educada. Os Reis ainda não convencidos fizeram um baile e disseram que a que dançasse melhor casava com seu filho. A rapariga começou a mexer-se e a dar aos braços e começaram a sair das mangas onde estavam os ossos pombas brancas e pretas.Uma pomba branca pousou na cabeça da outra que ficou feia. Ao verem aquilo os Reis já concordaram que o Príncipe casasse com a rapariga da rocha.
Recolha efectuada em Penha Garcia - Concelho de Idanha a Nova

A RAPOSA E A CARRIÇA
Era uma vez uma raposa e uma carriça. A raposa andava com muita fome e iatodos os dias ao tronco do carvalho e dizia: - Oh comadre carriça deite-me um carrichinho abaixo senão eu levanto o rabo e corto o carvalho. A carriça com medo deitava-lhe um carrichinho. Três dias lá foi e em todos lhe comeu carrichinho, dizendo que lhe levantava o rabo e lhe cortava ocarvalho. Ao quarto dia a raposa lá foi outra vez e disse: -Oh comadre deita-me cá um carricinho abaixo senão eu levanto o rabo e cortoo carvalho. A carriça deitou-lhe novamente um carriço, mas ficou a pensarcomo é que havia de se livrar da raposa. Na mesma tarde foi lá o mocho quelhe disse: -Oh comadre carriça onde estão os teus filhinhos? -Deitei-os à comadre raposa, que vem aí e diz que levanta o rabo e corta ocarvalho. Responde-lhe o mocho: -Ah parva! Quando ela voltar diz-lhe que rabo de raposa não corta carvalho só a força de homem e do gume do malho. No dia seguinte a raposa voltou lá edisse: -- Oh comadre carriça deita-me num carricinho abaixo senão levanto o rabo e corto o carvalho. A carriça já tinha aprendido a lição e disse-lhe: -Rabo de raposa não corta caralho, só a força do homem e o gume do malho. Araposa lá se foi embora com o rabo entre as pernas. Desta maneira a carriça livrou-se da raposa manhosa.
Recolha efectuada em Penha Garcia - Concelho de Idanha a Nova

D. GARCIA E DONA BRANCA
Diz a lenda que D. Garcia, Governador do Castelo da Penha Garcia, raptou em certa noite de tempestade, Dona Branca, figura de grande beleza, filha doGovernador de Monsanto. Este ficou furioso e perseguiu D. Garcia durante meses, até que o apanhou. A justiça impunha para estes casos a pena de morte. Mas o Governador de Monsanto condoído por causa da filha, puniu públicamente D. Garcia, tendo substituído pena capitaal pelo corte do braço esquerdo. Segundo reza a lenda a figura do decepado, continua ainda, no alto dastorres, vigiando e olhando o morro sobranceiro de Monsanto, causa da perda do seu braço.
Recolha efectuada em Penha Garcia - Concelho de Idanha a Nova

HISTÓRIA DO BURRINHO
O mundo ralha de tudo Tenham ou não tenham razão Vou contar-vos um história Em prova desta ascenção. Partiu um velho campónio do seu monte ao povoado. Levava um boneco que tinha no seu burro montado. Encontra uns que lhe dizem: -Olha aquele que tal é, ele montado no burro e o pobre do velho a pé. Então disse o velho para o rapaz: -Desce do burro que eu monto e tu vem caminhando a trás. Encontra outros que dizem: -Tamanhão como uma rata, ele a cavalo do burro e o pobre pequeno à pata. -Façamos os dois mais esta, montamo-nos os dois no burro ver se ainda nos censuram. Encontram outros que dizem: -Apeiem-se almas de bréu, querem matar o burrinho, aposto que não é seu. Agora ainda lhe pegaram os dois pelas pernas e outros pelas patas, assim lhe fizeram ao burro a ver se os censuram. Então, nesta foi uma das mais grandes censuras, tornados burros do burro.
É mau se monto no burro, se o rapaz monta mau é. Ambos montados é mau eé mau se vamos a pé. Rapaz vamos como dantes sirva-nos esta lição, é mais tolo quem dá ao mundo satisfação. Recolha efectuada em Penha Garcia - Concelho de Idanha a NovaA RAPOSA NA VINHA Era uma vez ma raposa qu’andava a roubar gatchos numa vinha. O dono da vinha certo dia começou a dar pa falta das uvas e no outro foi guardar avinha, encontrando-a lá em cima do sobreiro diz-lhe: -Ó poeta tás aqui? Respondeu-lhe a raposa:-Andava nas minhas vinhas A ver as novidades, Os cães das vizinhas, Fizeram-me esta caridade. Diz-lhe o dono da vinha: -Cavar nunca soubeste Vinhas nunca tiveste. Comer galos e galinhas E algumas eram minhas.Estou capaz de te tirar a fessura Pa saia do meu gato. Responde-lhe a raposa:-Cala-te aí meu macaco Qu’eu tenho ma pele Muito linda e muito bela Nem cão, nem bicho olha para ela.Quando o dono ia puxar pa spingarda, ela manda um pulo e foge.
Recolha efectuada em Penha Garcia - Concelho de Idanha a Nova.