segunda-feira, novembro 02, 2009

FESTA DA CABRA EM CIDÕES

Agradecimentos ao camarada e correligionário Silvério por ter referido o que se passa num pedaço do Portugal profundo:

Festa da Cabra e do Canhoto é já considerada uma das noites mais genuínas de Portugal.
A aldeia de Cidões, no concelho de Vinhais, prepara-se para celebrar, em mais uma tradicional “noite das bruxas”, a 31 de Outubro, a Festa da Cabra e do Canhoto. Esta é já considerada uma das noites mais genuínas de Portugal. Aqui não há bruxas de vassoura nem chapéus cónicos ou abóboras iluminadas, tradições importadas de outras localidades. Em Cidões a festa é transmontana, com origens que se perdem no tempo, e celebra-se como sempre se celebrou: “numa noite de folia e transgressão, generosidade e alegria, canhotos hão-de criar uma fogueira que ainda se faz numa encruzihada e ai daquele que não se aqueça nessa fogueira ou que não coma do banquete que ali se preparará” pois diz já diz a antiga lenda “quem no canhoto não se aquecer e da cabra não comer, um ano de azar vai ter”. É nessa fogueira que, em potes enormes, serão cozinhadas “velhas e boas cabras, machorras”. Dos potes sairá um repasto que chega para todos, locais e forasteiros: “suculenta carne de cabra, pão cozinho em antigos fornos de lenha, castanha assada, maçãs, figos e nozes”. Mas nesta noite secular haverá também o “interminável vinho e aguardente queimada” acompanhado de “histórias de arrepiar, de outros tempos” e muitas tropelias dos rapazes que visam evocar as energias renovadoras e propiciatórias do caos que caracteriza o fim e o princípio de um ciclo. Após o jantar, os rapazes percorrem a aldeia para a “virar do avesso”, literalmente. Roubam vasos de flores das varandas, viram do avesso carros de bois e carroças e, ao longo de toda a noite, passeiam com um carro de bois toda a noite fazendo-o “chiar” de modo a que ninguém durma.
Contos de terror, travessuras de jovens, grandes comezainas... isto é praticamente o mesmo que o Halloween americano. E a referência ao ano seguinte («...um ano de azar vai ter») coloca a festividade no âmbito da celebração céltica da passagem do ano. O que só significa que o Halloween não é tão estranho à nossa tradição europeia como algumas consciências conservadoras querem fazer crer.
Para mais alguns pormenores sobre o evento, clicar leia-se o que se segue:

Na noite mais propícia a todos os sustos, a população de Cidões, em Vinhais, esconjura, hoje, os demónios comendo, literalmente, a mais tradicional representação do demo a cabra. Como se não bastasse, a dita é cozinhada em grandes potes, sobre o fogo intenso do canhoto (tronco). Ninguém acredita em bruxas, mas não vá o diabo tecê-las, e melhor é todos petiscar a cabra,seja ela demónio, belzebu, diabo ou qualquer outro espírito maligno.
A festa é simbólica, mas está muito arreigada no espírito dos habitantes de Cidões, que se deslocam de vários pontos do país só para participar, como Ana Mendes que vive Sintra. A origem da festa perde-se na memória. "É muito antiga, eu sei lá quando começou", desabafa Luís Alves, um dos membros mais antigos da organização.
Ali, não há lugar aos mais recentes atropelos à tradição com costumes importados, não há vestígio de fantasias de bruxas de vassoura e chapéu negro nem abóboras luminosas do Halloween. "Cruzes, credo", benzem-se os mais velhos. "A tradição aqui é genuína" garante José Manuel, membro da Junta.
O repasto está marcado para as 20 horas, são esperadas algumas centenas de pessoas na "Festa da Cabra e do Canhoto". Geralmente o número ultrapassa os 400 comensais. A organização tem preparadas quatro machorras (cabras estéreis) para dar de comer a quem aparecer. A noite escura como o breu é aquecida com vinho e aguardente.
Enquanto o repasto vai apurando, os comensais petiscam castanhas assadas, figos e outros frutos secos.
O cenário é o ideal para uma noite de bruxarias. A aldeia está encaixada no sopé da serra, a estrada é íngreme, com declive acentuado, longe de tudo.
A noite é de transgressão. Após o jantar, os rapazes viram a "aldeia ao avesso", roubam vasos de flores das varandas, voltam carros de bois e carroças. Depois, vão passear com o carro de bois por toda a localidade, de modo a não deixar dormir ninguém devido ao "chiar" (ranger) das suas rodas.
"Chateavam-se e chateiam-se com esta barulheira, mas há que aguentar" diz Luís Alves. Reza a lenda que quem se aquecer na fogueira afasta a má sorte, "quem no canhoto não se aquecer e da cabra não comer, um ano de azar vai ter".

Tradição mantém-se
A festa da cabra e do canhoto é uma tradição ligada à noite de Todos os Santos, que se perdeu na maioria das localidades. Em Cidões queima-se o canhoto (tronco) e faz-se uma grande fogueira com lenha furtada, onde se cozinha cabras velhas.

Velhas, gordas e boas
Os costumes recomendam o uso de machorras (cabras velhas estéreis), que costumam engordar muito e por isso são boas para o banquete. Este ano foi preciso comprar parte delas noutras aldeias porque não havia número suficiente em Cidões.

Fogueira num cruzamento
A grande pilha de lenha que servirá para cozinhar a cabra já foi recolhida durante o fim-de-semana, para acautelar situações imprevistas. Foi colocada à estrada da aldeia próxima de um cruzamento, locais cheios de misticismo associados a bruxarias.

Receita do repasto
Ponha-se a carne da cabra dois dias em vinha-de-alhos. Pegue-se num pote de ferro e junte-se à carne azeite, cebola, cenoura e vinhos . O tempero do repasto é segredo. Dizem os os cidonsenses que é ancestral e que só "Chico", o cozinheiro oficial, o conhece.

4 Comments:

Blogger betoquintas said...

soltemos as cabras que os bodes querem cruzar... }|D

2 de novembro de 2009 às 13:57:00 WET  
Blogger betoquintas said...

grato pela notícia, Caturo.
eu reitero, apenas, que eu gostaria mais que focasse no Paganismo.

2 de novembro de 2009 às 14:02:00 WET  
Anonymous Anónimo said...

À pala deste post e da noticia que lhe deu origem, descobri este interessante blog da Asociacion del Profesorado de Portugués en Extremadura: http://appex.blogspot.com/

2 de novembro de 2009 às 15:05:00 WET  
Blogger Inês said...

Afinal, parece que as tradições recolhidas por autores como José Leite de Vasconcelos e Consiglieri Pedroso, não desapareceram ainda. Além disso, quero crer que as tradições às vezes são como os Deuses - julgamo-los mortos, mas a verdade é que tanto umas, como outros, não morrem. Regeneram-se. Existem no inconsciente colectivo que é como quem diz, deixam-se adormecer no vento e na chuva, nas árvores e nos rios, para mais tarde despertarem novamente, quando o povo estiver preparado para os receber outra vez em festa. Notícia inspiradora, essa, Caturo. Bem-hajas!

2 de novembro de 2009 às 19:17:00 WET  

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