terça-feira, maio 03, 2005

COMUNICADO DO GRUPO DOS AMIGOS DE OLIVENÇA - ENTREVISTA

Grupo dos Amigos de Olivença

Divulgação 06-2005

DIÁRIO DO SUL
29-Abril-2005
Jornalista LUÍS MANETA

Investigadora Ana Paula Fitas elabora tese sobre Olivença:
"PORTUGAL AFASTOU-SE E NEGLIGENCIOU O TERRITÓRIO OLIVENTINO"

Com a classificação máxima de "Muito Bom, com distinção e louvor", a investigadora Ana Paula Fitas doutourou-se na Universidade Nova de Lisboa com uma tese sobre a questão oliventina. "Continuidade Cultural e Mudança Social - Um Estudo Etnológico Comparado entre Juromenha e Olivença" é o título de um trabalho que analisa os últimos duzentos anos na vida das duas povoações.

Diário do Sul - Quais os motivos da escolha deste tema para a tese de
doutoramento?

Ana Paula Fitas - A questão da continuidade cultural é uma questão que do ponto de vista antropológico é determinante para compreender as sociedades contemporânes. Por um lado porque a continuidade cultural nos remete para a construção da identidade histórica, social, e cultural das populações. Por outro porque todas as sociedades estão sujeitas à mudança, que é um processo dinâmico da organização social. Nesta sentido trata-se de perceber como é que se processava a construção social das identidades culturais, históricas e sociais destas populações e destas regiões.

DS - E desse ponto de vista, este é um território muito particular. De que modo a questão de Olivença que, pelo menos do lado português continua em aberto, influenciou a escolha do local para a realização do estudo?

APF - O território composto pelos municípios de Juromenha e Olivença é óptimo para fazer um estudo deste tipo porque sendo uma área espacialmente contígua apresentava uma particularidade assaz pertinente para esta problemática e que se prende com o facto de há 204 anos atrás, portanto em 1801, Olivença ser um município português tal como Juromenha, que também era município e sede de Concelho. Eram duas localidades em espaço contíguo e sujeitas ao mesmo tipo de administração política. Passado este tempo há um processo de diferenciação na forma de organização social das duas populações uma vez que uma ficou sujeita à administração política
portuguesa, outra à espanhola. Daí ser interessante ver o que é que se manteve e o que é que mudou nestas duas localidades.

DS - No caso de Olivença, duzentos anos depois são perceptíveis alguns traços do que podemos denominar como "portugalidade"?

APF - Sim, sim...sem dúvida.

DS - Visíveis em que aspectos?

APF - É perfeitamente visível na gastronomia, na música popular, no folclore, muito influenciado pelos corridinhos e pelas saias. È também visível nas danças e na religião popular - o tipo de cultos, de manifestações religiosas, de festividades populares. E na língua, naturalmente.

DS - De um ponto de vista da língua, em que medida o Português está ainda presente em Olivença?

APF - A população oliventina fala português como segunda língua. A
população idosa, com mais de 60 anos, fala um português correcto
exactamente como os alentejanos. E dizem, ainda hoje o afirmam, que a fala deles é o Português. Utilizam a língua espanhola por uma questão de integração social, de socialização, porque há muita população espanhola que está ali instalada há diversas gerações e porque a administração política, institucional e escolar é espanhola. De forma que existe uma adaptação e uma adopção do espanhol como língua de uso, se assim se pode dizer.

DS - E o Português?

APF - É um Português, diria, alentejano. Porque mesmo em expressões
idiomáticas utilizam expressões como as que são usadas no Alentejo. Quando falamos em português com um oliventino idoso não encontramos nenhuma diferença.
A perda do uso da língua ficou a dever-se a questões políticas - o uso do Português foi proibido em meados do século XIX e novamente proibido em meados do século XX, o que fez com que a língua deixasse de ser usada em espaço público passando a falar-se quase xclusivamente no espaço doméstico. Com o processo de escolarização, as gerações mais recentes acabaram por adoptar a língua espanhola e deixaram de praticar o português.

DS - A Ana Paula Fitas refere que da parte portuguesa, todo esse património cultural e etnológico de Olivença foi deixado como que ao abandono.

APF - A questão política impediu qualquer aproximação do ponto de ista físico, social e cultural. Nem o Estado Português nem os Portugueses se mobilizaram para reforçar o património cultural português em Olivença. Do ponto de vista arquitectónico isso poderia ser difícil uma vez que a administração é espanhola mas ao nível das actividades culturais e de divulgação da leitura, por exemplo, esse trabalho nunca foi feito. O Estado afastou-se e negligenciou completamente aquele território deixando-o exposto a todos os tipos de influências e de construção social que Espanha quisesse esenvolver em território oliventino.

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