domingo, março 06, 2022

COERÊNCIA NACIONALISTA DIANTE DE UMA INVASÃO IMPERIALISTA

A necessidade de participar no jogo político não pode fazer esquecer os Princípios em nome dos quais nele se participa.
A capacidade de manobra táctica orientada pelo espírito prático não deve, para um nacionalista, obnubilar a sua causa ideológica propriamente dita, sob pena de que toda a sua acção política se esvazie de sentido – e possa até ficar comprometida, se afinal a «jogada» sair pela culatra, como sói dizer-se.
O futuro é sempre uma incógnita e aquilo que se ignora do mundo é sempre muito mais do que aquilo que dele se conhece, pelo que as previsões são sempre dificílimas de elaborar, e isto nas vezes em que se confirmam... Assevera um certo ditado que Deus ri quando o homem se põe a fazer planos. Mais vale então que se controle o que se pode controlar - a intenção, no fundo, é realmente o que mais interessa e o melhor guia de actuação, sempre com a necessária prudência, num equilíbrio sensato, pois que, como já dizia Platão, ainda melhor que o saber e do que tudo o resto, é a justa medida das coisas.
A mais elementar noção de Justiça é por isso o principal critério para avaliar tudo o que se contempla antes da acção propriamente dita. Um nacionalista europeu não pode por este motivo aprovar a intervenção de Putin contra Kiiv. Nada justifica que se lhe reconheça legitimidade nesse sangrento caminho – que tenha recuperado a Crimeia, enfim, aceita-se, dado que tal território é de maioria étnica russa; fora isso, o ex-KGB nada fez em prol de Nação europeia alguma, pugna apenas pela sua noção imperial de Pátria, incompatível, já se vê, com outras soberanias nacionais.

Urge deixar para trás os messianismos correntes em certos meios da Ultra-Direita, mais concretamente num determinado sector anti-democrático que parece sofrer de uma espécie de orfandade crónica, sempre em busca de um dux iluminado que o conduza, sempre emocional e estruturalmente dependente da ideia de um herói salvador, supremo e infalível, que o venha guiar à vitória e ao bem-aventurado império eterno ou coisa parecida. Se não é Hitler nem Mussolini, nem Franco nem Salazar, que seja «o irmão Putin!» ou outro qualquer que pareça ter «os tomates no sítio!» e seja capaz de «dar cabo disto tudo!», porque a via democrática está, para este pessoal, fora de questão, porque sim, porque está, porque «o povinho» é «carneiro» e a Democracia é por isto mesmo odiosa, bom mesmo é seguir devotamente um chefão fortalhaço – assim é-se «carneiro» à mesma, mas com «estilo»… com «estilo» e com respeitinho, porque enquanto em Democracia se pode discordar e ficar tranquilamente fora do poder, num sistema autocrático destes, pelo contrário, ai de quem discorde e queira quedar-se de parte, que não tem nada que lhe proteja os direitos… mas pronto, há um ídolo vivo; acresce que precisar de levar em consideração as opiniões de opositores, de mulheres, de deficientes, de velhotes pobres, de pessoal «degenerado», etc., não é para estes guerreiros que só respeitam quem tenha ferro maior que o seu…
Esta ânsia por um condutor lembra também a ingénua esperança da liderança católica medieval de que houvesse no Oriente um Prestes João que ajudasse a Cristandade europeia a derrotar a Moirama… não havia afinal Prestes João algum e a Europa teve de desenvolver as suas capacidades racionais para bater o Islão, o que acabou por fazer séculos mais tarde.
Se a política putínica vem ou não a ser útil às Nações do Ocidente, não está claro de momento, não parecendo para já absolutamente nada prudente, para dizer o mínimo, contar com sapatos de defunto. Trocar os princípios por uma putativa conveniência feita de vento é, além de imoral, imprudente.
Sabe-se, é certo, que algumas forças nacionalistas da Europa Ocidental têm tido apoio monetário pela mão de Putin, dele precisando apenas e exclusivamente porque as elites que controlam o Ocidente não se pouparam a golpes sujos para sufocar financeiramente partidos como a RN francesa, elites que querem fazer pelo bolso bancário o que não conseguem fazer pela urna de voto.
Todavia, a Rússia não é só Putin.
A Rússia é uma nação antiga, não um conglomerado de tribos unidas por um caudilho. Caso isto não seja verdade, então a Rússia está de qualquer modo condenada a desaparecer depois da morte do seu actual presidente, o que não faz grande sentido… enfim, não faltarão por lá outros líderes ou pelo menos capatazes que possam manter hasteada a bandeira russa e, também, simpatizar com as causas nacionalistas europeias, nomeadamente Dmitry Medvedev, ou ainda Dmitry Rogozin, que é hoje director da Roscomos (agência espacial russa) e que, quando era embaixador da Rússia à OTAN em 2009, emitiu, depois de uma ameaça contextual, uma mensagem pessoal a apelar à união dos Povos de raça branca – Rússia, Europa, América do Norte - diante do terceiro-mundo:
«Se a civilização do Norte se quiser proteger a si própria, tem de estar unida: a América, a União Europeia, a Rússia. Se não estiverem juntas, serão derrotadas uma por uma.»
Que não haja, atenção, grandes expectativas sobre este Rogozin, que também tem o seu quê de ferrabrás, para não dizer outra coisa («bully»); quando, em certa ocasião, o governo romeno impediu que o avião comercial em que Rogozin seguia entrasse no espaço aéreo da Roménia, Rogozin escreveu furiosamente no seu Twitter que da próxima vez ia lá estar a bordo de um Tu-160 (bombardeiro supersónico nuclear ao qual a OTAN chamava «Blackjack» e os próprios Russos chamam «Belyy Lebed» ou «Cisne Branco»). Pode, todavia, amenizar-se Rogozin se a actual política de Putin falhar, seja por prudência seja, até, porque não, pelo peso da idade… Khrushchov, ou Cruchcov, também era um duro e amainou; entretanto, cresce hoje a ameaça islamista e o potentado chinês, que a Rússia cada vez menos poderá ignorar, pelo que estará mais necessitada que nunca de alguma paz com o Ocidente.
Um eventual abrandamento da garra russa poderá, em última análise, significar a queda do regime fantoche de Lucachenco (Лукашэнка, se preferirdes – de «Lukashenko» é que não há necessidade, que essa é somente a transcrição anglo-saxónica), não vindo daí grande mal ao mundo; na Síria, o laico e ocidentalizado Assad não cai com duas cantigas, até porque os Ianques já devem ter percebido a sua utilidade na zona; o Irão, por seu turno, ficará mais isolado, o que só pode ser bom para o maior aliado da Europa na região, que é Israel, país do Povo cujo direito ao território que ocupa só tem igual em legitimidade quando comparado ao dos seus aliados Curdos de área limítrofe; Israel é um Estado democrático cuja poderosa Direita nacionalista, até há pouco tempo no governo (e ainda parcialmente no poder), apoia abertamente forças nacionalistas europeias como a RN, a Liga Norte e o governo húngaro de Orbán, entre outras.
De resto, se Putin ficar ganhador nesta jornada, e for realmente o bom europeu que alguns messianistas patrióticos apregoam, saberá reconhecer nos Nacionalistas da Europa Ocidental os devidos parceiros de poder, podendo neste caso perdoar alguma tomada de posição nacionalista europeia contra a sua política militar na Ucrânia, posição essa da qual é já exemplo, felizmente, a atitude da candidata presidencial francesa Marine Le Pen, que recentemente soube distanciar-se da actual senda putínica… entrementes, os nacionalistas de toda a Europa fazem figas das mais apertadas para que a arrogância ofensiva de Putin não desgrace os resultados eleitorais dos nacionalistas europeus em França e na Hungria, que estão para breve…
A derrocada final do governo venezuelano, do regime cubano e da Coreia do Norte revelar-se-ia boa demais para ser verdade, boa demais para os próprios países em questão e para a paz no mundo, isto já seria sonhar demasiado; mas, enfim, por outro lado não se afiguraria impossível que a China recuasse nas suas aspirações imperiais à Formosa (Taiwan), o que também significaria um alívio jeitoso nas tensões internacionais e na eventualidade de uma terceira guerra mundial da maior das gravidades para o Ocidente, que as forças armadas de Pequim poderão neste momento constituir já um inimigo muito mais letal do que tudo o que Moscovo possa representar… um enfraquecimento interno do actual regime chinês seria nada menos que fabuloso para o Ocidente e para o resto do mundo – até para os próprios Chineses, sobretudo para as minorias étnicas no seu território – e, também, para a Índia, potência regional democrática, aliada natural do Ocidente que está cada vez mais apertada entre o poderio chinês e a ameaça islamista do Paquistão.
Num mundo complexo e em notória mutação política, há divergentes motivações para se apoiar determinado poder. Claro que o PCP, que foi estalinista a vida toda sem que ninguém o quisesse ilegalizar por ser anti-democrático, nunca teve pudor nem vergonha em defender agressores contra a «ordem capitalista», com a mesma boçalidade com que defende invariavelmente a tauromaquia, ao passo que todo o resto da Esquerda e de todas as Direitas conscientes condena obviamente a invasão putínica, uma vez que, ao fim ao cabo, todos estes políticos estão a falar para o povo e sabem que o homem comum não aprova guerras de qualquer espécie. Obviamente que não há mais nenhuma excepção, muito menos na Extrema-Esquerda, olha quem, nesses meandros é tudo gente finesse e sofisticada que não se deixaria apanhar numa tourada destas, até porque não tem nada de especial em comum com o patriótico e chauvinista Putin, antes pelo contrário, o presidente russo foi formado pelo regime que assassinou o guru espiritual do BE, o internacionalista Leon Trotski; antes disso, Trotski tinha criticado o estalinismo por ter este abdicado do internacionalismo…
Ainda no panorama político nacional, não pode um nacionalista deixar de louvar a posição do Ergue-te, que soube atempadamente manifestar a sua solidariedade para com a Ucrânia, sublinhando a coerência lógica da sua posição autenticamente nacionalista: «sendo a Ucrânia um país livre e soberano, aceitar esta invasão é aceitar futuras invasões a outros países, e validar anteriores invasões, venham elas de onde vierem.» A Política, Política a sério, começa por ser isto – primeiro, e antes de mais nada, a coerência ideológica; quanto a jogadas políticas ulteriores que sacrifiquem a ideologia a um princípio de realpolitik, enfim, em muitos casos é um já a formiga tem catarro, além de constituir também um péssimo indicador em matéria de ética política. Se algum dia se quer combater a corrupção seja do que for – do aparelho político ou dos costumes – há que, em primeiro lugar, combater a corrupção ideológica e salvaguardar os seus próprios princípios.
Em suma, com ou sem Putin, a Rússia não morre, mesmo que mude, e o Nacionalismo europeu não pára.

4 Comments:

Anonymous Anónimo said...

https://www.infomoney.com.br/politica/audio-sobre-mulheres-ucranianas-de-deputado-arthur-do-val-causa-revolta-no-meio-politico-e-redes-sociais/

6 de março de 2022 às 10:55:00 WET  
Anonymous Anónimo said...

Bom post.

6 de março de 2022 às 19:32:00 WET  
Blogger mensagensnanett said...

Se, em oposição ao cidadanismo de Roma da NATO... a Russia apoiar a elaboração do Mais Elementar dos Tratados de Paz...
----> A RUSSIA PODERÁ VIR A SER A LÍDER DO MUNDO LIVRE!
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Os boys e girls unidos no '''saque das riquezas da Russia''' pretendem comer- nos por parvos!
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Sim: os boys e girls unidos no '''saque das riquezas da Russia''' recusam o Mais Elementar dos Tratados de Paz:
---> um tratado de paz que recuse o MAIS VELHO DISCURSO DE ÓDIO DA HISTÓRIA -> o ódio tiques-dos-impérios: o ódio a povos autóctones dotados da Liberdade de ter o seu espaço e prosperar ao seu ritmo.
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O cidadão de Roma da NATO ambiciona fazer na Russia (um território imenso no planeta, com apenas 140 milhões de habitantes)... aquilo que já foi feito a povos autóctones da América do Norte, do Sul, etc
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Os autóctones Identitários são alvo de ódio por parte dos cidadãos de Roma da NATO... porque... os Identitários autóctones não estão interessados em:
1- negociatas de índole esclavagista: isto é, negociatas que pressupõem a existência de outros como fornecedores de abundância de mão-de-obra servil.
2- negociatas de índole colonialista: isto é, negociatas que pressupõem a substituição populacional de povos autóctones considerados economicamente pouco rentáveis.
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-> Para o cidadão de Roma da NATO roubar/saquear territórios (em conjunto com sabotagens sociológicas: substituições populacionais, holocaustos massivos, etc) a povos autóctones...
... é uma herança universalista/multiculturalista!?!
[veja-se: América do Norte, Sul, etc]
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Mais:
- quando se fala na devolução de territórios a povos autóctones (que foram impedidos de ter tempo de prosperar ao seu ritmo)... o cidadão de Roma da NATO quer que essa devolução seja considerada 'racismo'!?!
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Mais:
- o cidadão de Roma da NATO instiga o cerco a Vladimir Putin por países da NATO: boys e girls a aguçar o dente às riquezas da Russia.
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Putin deveria ter feito uma ofensiva diplomática:
-> os líderes do europeu-do-sistema XX-XXI (Merkel, Sarkozy, etc) deveriam ser JULGADOS POR CRIMES CONTRA A HUMANIDADE.
[estiveram em conluio, quer com a destruição de economias, quer com o massacre de milhões de pessoas]
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Um exemplo:
- Merkel (etc) bloqueiam a investigação à forma como chegam armas a 'grupos rebeldes' que... não possuem fábricas de armamento!
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Merkel (etc) estão preocupados é em acusar de '''RACISTAS'''/xenófobos os Identitários separatistas que dizem o óbvio:
- «a recepção de refugiados faź parte do negócio... os países aonde são produzidas as armas utilizadas pelos 'grupos rebeldes' é que têm de pagar a ajuda aos refugiados».
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[É isso: a máfia do armamento fornece armas a 'grupos rebeldes' (sim: os 'grupos rebeldes' não possuem fábricas de armamento!) para lucrar, não apenas com a venda de armas, mas também com o acesso a recursos naturais de baixo custo (petróleo, etc)... e mais, são deslocados para locais aonde existem investimentos interessados em negócios de abundância de mão-de-obra servil].
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SEPARATISMO IDENTITÁRIO; sim, óbvio!!!
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Os IDENTITÁRIOS SEPARATISTAS vão querer estar em coligação com a Russia
... e...
vão querer LIBERDADE/DISTÂNCIA/SEPARATISMO do cidadão de Roma da NATO.
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Sim:
- NA ORIGEM DA NACIONALIDADE ESTEVE O IDEAL DE LIBERDADE IDENTITÁRIO ("ter o seu espaço, prosperar ao seu ritmo")... não foi... o ódio do cidadanismo de Roma.
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SEPARATISMO 50-50:
-> os globalization-lovers, UE-lovers, etc, que fiquem na sua... desde que respeitem os Direitos dos outros... e vice-versa.
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-» blog http://separatismo--50--50.blogspot.com

7 de março de 2022 às 14:54:00 WET  
Anonymous Anónimo said...

"que tenha recuperado a Crimeia, enfim, aceita-se, dado que tal território é de maioria étnica russa."

Contra uma potencia barbara as vezes melhor dar um pé e ficar com o resto do corpo, mas aparentemente o actual chefe do projeto imperial russo quer o corpo todo e mais alguma coisa...

Mas vamos supor que ele apenas queria as partes da Ucrania com maioria russa e isso é legitimo: estamos a abrir o pressuposto de que amamha a Amadora pode ser de Cabo Verde porque sao a maioria...que nao sei quantas zonas de Franca sao de nao sei quem porque é a maioria...até neste caso dessas zonas da ucrania os russos nao eram a maioria nessas regioes, simplesmente tornaram-se a maioria apos migracões.

12 de março de 2022 às 13:09:00 WET  

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