sexta-feira, abril 07, 2017

«O MONOTEÍSMO DEFORMOU AS RELAÇÕES DO HOMEM COM O HOMEM, A NATUREZA E O ALÉM»

Agradecimentos a quem aqui trouxe este interessante artigo, cuja leitura integral recomendo: http://expresso.sapo.pt/cultura/2016-11-05-Adonis-O-monoteismo-colonizou-o-nosso-cerebro
Caracteriza-se por um pensamento adepto do pluralismo com raízes na antiga tradição cultural politeísta. Saliento em particular as seguintes passagens da entrevista:

«Jornalista: Mas lembra que o Islão é, desde o início, uma religião do poder...
«Adonis»: Absolutamente. Desde o início que é a guerra. Dos quatro primeiros califas, os fundadores, três foram assassinados. E demorou meio século até se fundar o primeiro estado, em Damasco.

J: Mas isso não acontece com todas as religiões?
A: Com todas as religiões não, mas com os três monoteísmos. E se há diferenças são diferenças de grau, não de natureza. Mas o cristianismo fez a sua revolução, separou a religião da política.»

(...)

«J: Também escreveu muita poesia das ruínas. Poemas sobre Beirute, sobre a cidade como inferno. Cidades onde a guerra e a violência são uma constante.
A: Isso está ligado também ao monoteísmo. A visão monoteísta do mundo deformou as relações do homem com o homem, do homem com a natureza, do homem com o além da natureza. Deformou tudo. O monoteísmo colonizou o nosso cérebro e não podemos ver a realidade do universo se não nos libertamos desse fechamento do monoteísmo. É esse actualmente o nosso grande problema, não apenas no mundo árabe mas também no mundo ocidental.»

O monoteísmo abraâmico é, ao fim ao cabo, o fundamento do totalitarismo político no Ocidente. É, em certa medida, herdeiro da ausência de apreço pela liberdade que já Aristóteles observava nos orientais, embora haja também todo um mundo asiático aberto à diversidade, o mundo pagão, politeísta, que este filósofo árabe poderá de algum modo invocar, até porque o nome que escolheu para si, Adónis, corresponde a um mito helénico de origem eventualmente semita ou, seguramente, médio-oriental.