quarta-feira, julho 10, 2013

SOBRE OS CIGANOS NA REPÚBLICA CHECA

A cidade de Ceske Budejovice abalou recentemente as nossas habituais noções sobre a República Tcheca com informações e reportagens sobre as massiças manifestações anti-ciganas de skinheads, com a polícia montada, os canhões de água e o gás lacrimogéneo usados pelas autoridades para impedir a violência contra os ciganos.
Tudo isso não encaixa na imagem que temos de uma República Tcheca pacífica. Houve, no entanto, quem não tivesse ficado surpreendido. “A ciganofobia já é há muito tempo uma doença dos tchecos”, refere a doutora em ciências históricas Nadezhda Demeter, vice-presidente da União Romani Internacional: “Na República Tcheca vivem até 300 mil ciganos, é uma minoria étnica muito numerosa. Por um lado, lá faz-se muita coisa em seu benefício. Existe, por exemplo, uma faculdade de Cultura Cigana na Universidade Carolina de Praga, existe um Partido Cigano, diversas organizações cívicas e de direitos humanos, inspectores especializados do Ministério da Educação controlam o ensino proporcionado aos ciganos. Mas, por outro lado, por todo o país encontram-se factos de discriminação dos ciganos. E não é só ao nível da vida quotidiana. Numa certa altura, eu trabalhei no jornal Romano Kurko, que continua a ser publicado em Brno. Eles fizeram uma pesquisa, segundo a qual em 600 dos 1000 inquiridos foram, desta ou daquela forma, vítimas de discriminação. Era-lhes recusado trabalho, não conseguiam obter habitação a preços acessíveis, recusavam-lhes tratamento médico ou não aceitavam viver perto deles…”
Onde estarão as raízes da ciganofobia tcheca? Pois já no tempo dos comunistas eles não tinham uma vida fácil. Segundo recordou Nadezhda Demeter, durante a guerra, a Tchecoslováquia foi um dos poucos países onde a população cigana foi praticamente exterminada e onde as mulheres ciganas eram esterilizadas. Claro que isso foi feito pelos nazis. Mas então porque construíram, já depois da guerra, sobre as ossadas dos ciganos que eles mataram uma suinicultura e um hotel para turistas em Hodonin? Porque é que as autoridades locais destruíram a pedra que um grupo de ciganos colocou em memória dos presos do campo de concentração de Lety?
“A atitude relativamente aos ciganos como mentalmente atrasados e um povo de criminosos é comum na democrática República Tcheca. Sim, é verdade que os ciganos não são umas pombas, como se diz. Mas o que os leva a cometer delitos? O desemprego, que é superior à média nacional. No entanto, na República Tcheca há muitos ciganos instruídos da chamada classe média. Mas estes não aprendem a sua própria língua e estão completamente assimilados. Talvez se recordem que antigamente os seus documentos eram marcados com a letra “R” e, por isso, não querem dar nas vistas e escondem a pertença ao seu próprio povo.”
Os tchecos não querem ser tolerantes com os ciganos, desprezam-nos. Essa doença feia dos seus concidadãos era reconhecida por Vaclav Havel. Uma vez ele visitou um festival cigano numa manifestação ostensiva de apoio aos ciganos. E estes retribuíram-lhe com 5 por cento dos votos nas eleições presidenciais.
 De acordo com os dados da professora Demeter, na Europa vivem 8 milhões de ciganos, a maioria dos quais na Roménia, na Bulgária, na República Tcheca e na Eslováquia. Até 60% desses ciganos são analfabetos, mais de 80% não têm trabalho e mais de 90% (números horríveis!) vivem abaixo do limiar da pobreza. A União Europeia proclamou os anos de 2005-2015 como Década dos Ciganos e são atribuídas grandes dotações para a sua adaptação à sociedade. Mas isso não influencia de maneira nenhuma os sentimentos dos cabeças raspadas que estão sempre prontos a provocar tumultos contra os ciganos. Acontece também que os ciganos, indefesos do ponto de vista legal, respondem à violência com violência. Alguns sonham mesmo com a criação de um Estado cigano independente.
E será bem bom que isso aconteça, embora não em solo europeu, bem entendido... A cada Povo o seu  Estado - em cada Estado, um só Povo. Mais de uma estirpe a viver no mesmo Estado é condicionante virtualmente inevitável para conflito presente ou futuro, tanto mais quanto mais uma ou mais dessas gentes tiver uma natural atitude de domínio territorial.