SOBRE A EVENTUAL INFLUÊNCIA DO SANGUE NA DEFINIÇÃO DE PORTUGAL - II

No fim do Império árabe, o sangue das raças primitivas prevaleceu sobre o dos conquistadores, fazendo-lhe perder o sentimento da sua origem comum, exactamente como nos fins do Império Romano; os Árabes nunca puderam extender o seu domínio ao alto das Astúrias e Vascongadas, onde se formou um império com todos os Povos godo-celtas que escaparam ao domínio sarraceno.

Foi daí que partiu o libertamento de toda a Península e a vitória do elemento europeu sobre o elemento semítico.

Na Península Ibérica, formaram-se dois centros de acção e movimento, dos quais saíram as duas correntes opostas que produziram a luta tenaz e persistente entre o indígena e o árabe, acabando por a torrente do elemento europeu subjugar e vencer a torrente formada pelo sangue semítico.

O reino das Astúrias foi-se dilatando, pouco a pouco, por toda a Hispânia, até se formar o reino de Leão com bastantes terras conquistadas aos Árabes.

E, enquanto esta corrente do norte tendia a apoderar-se de toda a Hispânia, nós vemos os povos lusitanos insurreccionarem-se e auxiliarem os seus irmãos asturianos e vasconços, tendendo para eles! É que sob o mesmo império árabe o sangue godo-céltico acabara por dominar o sangue semítico e estabelecera as mesmas correntes opostas que se observam no geral da Península.

Esta poderosa revolução das leis etnológicas operada no meio do império sarraceno é que preparou a ruína deste e o terreno para o domínio leonês.

A facilidade com que o reino de Leão, tão pequeno para o grande colosso do império muçulmano, conquistou as províncias hispânicas, não é facto para causar admiração aos que atenderem à grande revolução étnica operada em toda a Península.

Enquanto o Povo Leonês combatia contra os infiéis, a natureza ia-lhe adiante preparando o terreno e extinguindo nos povos o sangue semítico!

Neste combate do velho contra o novo mundo era natural que os povos iberos se reunissem entre si para combaterem o inimigo comum.

A Galiza e parte da Lusitânia são tiradas aos Mouros, indo formar o grande reino cristão. Fernando Magno reuniu na sua cabeça os reinos de Leão e Castela, formados das Astúrias, das Vascongadas, Biscaia, Catalunha, Galiza, Castela e parte da Lusitânia, por onde aquele monarca se estendeu até Coimbra, em que assentou a sua corte.

O domínio das raças europeias estava definitivamente estabelecido; e nada seria capaz de o aluir. O medo deixou de influir nos povos que entre si se uniram contra Mouros e Árabes. E desde que o reino de Leão se tornou tão forte e poderoso, o que é que observamos? Os antigos povos celtiberos proclamarem outra vez a sua primitiva independência e tenderem a separar-se uns dos outros!

(...)

In «As Raças Historicas na Lusitania», parte da Bibliotheca do Povo e das Escolas, 1883.