domingo, fevereiro 11, 2007

IGREJA ORTODOXA RUSSA PREOCUPADA COM PAGANISMO DE MARI EL

Sacerdote (Kart) oficiando.



Durante muito tempo, a Igreja Ortodoxa Russa teve possibilidade de inibir o crescimento da concorrência religiosa, a qual tinha sobretudo origem no Ocidente. E teve essa possibilidade porque na Rússia existia uma lei que dava estatuto especial às religiões «tradicionais». Todavia, esta lei, datada de 1997, acaba por dar mais apoio a uma determinada religião pagã do que à Igreja Ortodoxa.

E esta religião pagã,
assim beneficiada, é a do povo dos Mari.

Os Mari vivem na chamada República Mari El, que faz parte da Federação Russa e fica a oitocentos quilómetros a leste de Moscovo, mas a oeste dos Montes Urais, que separam a Europa da Ásia. Mari El fica por isso em território europeu. Tem muitos habitantes russos, mas a minoria étnica que dá o nome a esta terra, e que já foi maioria, anda por volta do meio milhão de pessoas. Os Mari são de raiz uralo-altaica, parentes por isso dos Finlandeses. Não obstante, há quem pense que o seu etnónimo é de origem indo-europeia, do radical indo-ariano *Mar-, que por sua vez deriva do proto-indo-europeu *Mer- e que significa «Homem, Mortal».

Apesar de muitos Maris terem aderido à religião ortodoxa russa, uma boa parte deste Povo continua leal à sua antiga fé, a do Paganismo nacional. O movimento tem mais de cem sacerdotes, os «karts», e talvez cerca de trezentos bosques sagrados onde se praticam os rituais pagãos dos seus ancestrais.

Um antropólogo deste povo, Nikandr Popov, afirma que o interesse no Paganismo dos Maris está a crescer: «A gente jovem tem um interesse especial nesta religião, estão agora a prestar-lhe mais atenção. O interesse cresceu, porque constitui as raízes da nossa cultura, é a base da nossa espiritualidade, portanto a gente jovem tem agora mais interesse nela. Penso que no século XXI ainda vai haver pessoas a adorar os seus antigos Deuses

Para consternação da Igreja Ortodoxa Russa e de pelo menos uma igreja protestante da zona, os pagãos Maris estão agora a querer adquirir o reconhecimento de religião tradicional na Rússia. Tal estatuto irá pô-los ao nível da Ortodoxia Russa, do Islão, do Judaísmo e do Budismo.

Geraldine Fagan, correspondente em Moscovo do Keston News, grupo britânico especializado em assuntos religiosos nas antigas nações comunistas, viajou recentemente a Mari El com o intuito de conhecer os pagãos Maris e os seus santuários. E disse que os líderes ortodoxos russos estão a ficar frustrados com as consequências duma lei de 1997 que eles apoiaram, a qual, apesar de não mencionar especificamente o Paganismo, apoia os direitos das chamadas religiões «tradicionais».

Ou seja, a Igreja dominante do País quis usar em seu proveito o sistema jurídico, para garantir ou mesmo reforçar o seu poder, mas o tiro acabou por lhe sair pela culatra.


O interesse no Paganismo em todo o mundo ressurgiu nos últimos cinquenta anos como um produto do movimento «New Age» dos anos sessenta, desenvolvendo crenças na comunicação com os espíritos, na reencarnação e na adoração da Natureza. Mas os pagãos Maris não cabem no mesmo saco que o Neo-Paganismo, uma vez que a sua tradição data da pré-história. É uma espécie de Panteísmo, no qual eles encontram as suas Deidades em objectos tais como árvores e bosques sagrados.

Os pagãos Maris não foram nem reconhecidos nem registados no tempo dos Soviéticos. Geraldine Fagan diz que isto complica o seu reconhecimento agora: «E se são assim um grupo desorganizado no qual não é nítido quem manda, e se não têm qualquer documentação legal - e os pagãos não a tinham, porque não foram registados durante o período soviético.»
Para agravar o caso, acrescenta Fagan, há ainda o problema de os pagãos Maris não terem edifícios de culto, o que tornou impossível o seu reconhecimento legal na era soviética.

Todavia, ainda segundo a supra-citada jornalista, algumas autoridades locais estão a apoiar os desorganizados, dispersos e por vezes ingénuos líderes pagãos a fazerem o seu caminho no labiríntico processo de registo russo. Diz Fagan: «Penso que enquanto as autoridades locais estiverem interessadas em promover um tipo de identidade nacional, continuarão a incluir os pagãos como uma espécie de local tradicional de culto que precisa de ser, enfim, pelo menos tacitamente apoiado.»

O antropólogo Popov concorda, acrescentando que os pagãos Maris nunca tiveram uma agenda política: «Muito provavelmente, o crescimento do Paganismo está relacionado com o crescimento da auto-consciência nacional. Aqui ninguém fala duma autonomia política, porque o Paganismo Mari nunca dinamizou quaisquer objectivos políticos, tal como qualquer outra religião pagã

Este estudioso afirma que as dificuldades dos pagãos Mari em registarem a sua religião são em grande parte devidas ao facto de os líderes pagãos idosos não estarem familiarizados com as leis e com os procedimentos requeridos. Além disso, a maioria dos homens de negócios da zona são, ou cristãos ortodoxos ou muçulmanos tatares (outra minoria étno-religiosa de Mari El), por isso há muito poucos recursos dedicados a apoiar o Paganismo Mari.

No que respeita ao sentimento popular, Popov diz que o Paganismo não foi abertamente vilificado, apesar de alguns protestos ocasionais da Igreja Ortodoxa. «A Igreja Ortodoxa não está preocupada (com a disseminação do Paganismo). Mas, quando falam com os crentes, dizem sempre que (o paganismo) é o culto do diabo, porque não reconhece Jesus Cristo e vai contra os pilares do Cristianismo.»

As rivalidades entre líderes de diferentes grupos pagãos levaram à troca de maldições, o que, segundo Popov, pode ter a ver com a invulgarmente alta taxa de suicídios entre os pagãos Maris.
As suas práticas tradicionais incluem sacrifícios animais, curas mágicas e feitiços.