PELA JUSTIÇA EM OLIVENÇA
Do Correio da Manhã, via Forum Nacional:
Expedição - 'Hermanos' mas pouco
OLIVENÇA AMORDAÇADA
Afinal Olivença é nossa ou é deles? Um punhado de portugueses decidiu invadir a cidade, para agitar a ‘vuelta’. Passaram as bicicletas, mas não passou a bandeira portuguesa – bastou um luso levantá-la, que logo lhe caiu em cima ‘la Guardia’.
Marta Vitorino
A comitiva foi sempre vigiada de perto pela polícia; e quando foi mostrada a bandeira aqueceram os ânimos.
À porta da Aula Magna, em Lisboa, Fernando Castanhinha não consegue esconder o crescente nervoso miudinho. Os primeiros raios de sol começam a despontar e o aumento do trânsito em Lisboa pode comprometer a chegada a tempo e horas a Olivença, zona de fronteira que tem há dois séculos dividido portugueses e espanhóis.
Secretário-Geral do Grupo dos Amigos de Olivença (GAO), associação com 600 elementos que tem vindo a reclamar a passagem da localidade para administração lusitana, o médico quer estar lá por volta das 10 horas (mais uma em Espanha), para presenciar a apresentação dos ciclistas da Volta a Espanha, que este ano, estranhamente, (ver caixa) passa por ali. “Marcámos a saída para as sete da manhã e vamos partir com meia hora de atraso. A malta tem de ser controlada com uma disciplina militar”, desabafa em tom de general minutos após mandar seguir um primeiro carro.
Minutos depois, e já com o jipe cheio, é a sua vez de pôr o motor a trabalhar e pisar no acelerador para compensar o tempo perdido. Bem feitas as contas, sempre consegue percorrer os mais de 200 quilómetros sem problemas, até porque conhece de cor o trajecto. Antes de em 1998 ter entrado para o GAO tinha ido apenas uma vez até àquela região, mas desde então somam-se viagens consecutivas.
A última aconteceu por altura do Euro’2004, quando na véspera da final frente à Grécia decidiu reunir as tropas e fazer uma visita inesperada: “Era uma ocasião única para, sob pretexto da final do evento, irmos lá entregar bandeiras portuguesas à descarada, sem que ninguém nos pudesse dizer nada. Comprei 50 e fomos ao mercado”. Embora ao início as pessoas estivessem hesitantes, a operação saldou-se num êxito, e nem os cachecóis escaparam.
A apoteose registada por essa altura dá alento suplementar para a viagem, embora sejam esperados problemas numa segunda visita em tão curto espaço de tempo. Poucos metros depois da ponte sobre o Guadiana, já do lado espanhol, seis agentes da guardia civil fazem a recepção de boas-vindas exigindo a amostragem dos Bilhetes de Identidade, seguida de uma breve vistoria à mala do veículo.
Mais importante que encontrar material ilícito, procuram algo que identifique a nacionalidade do grupo. Fernando consegue escapar ao controlo meio amador – o nome dos passageiros foi copiado para um pequeno bloco de notas –, mas a mesma sorte não tiveram os condutores de outros veículos, obrigados a entregar bandeiras, panfletos e cachecóis vermelhos e verdes.
“Eles agora fazem isto. Já da outra vez estavam aqui a controlar. Acho que desde o 11 de Março de Madrid que andam paranóicos com a possibilidade de novos atentados”, diz Manuel Alonso, pendura de Fernando na aventura, como que a tentar justificar tão rigoroso patrulhamento.
ALTA TENSÃO
Refeitos do primeiro teste aos nervos, Fernando Castanhinha e Manuel Alonso seguem viagem, avistando Olivença ao fim de uns minutos. Pelo curto caminho puxam da memória e dão lições de Geografia e História sobre todos os aspectos de uma população “pobre, subserviente e durante muitos anos votada ao esquecimento e à clausura”.
Estacionam perto de um café, não muito longe do local onde está instalado o palanque de apresentação dos ciclistas. Misturam-se entre a multidão e pouco antes dos ponteiros do relógio baterem as 10h30 sacam das resmas de panfletos onde no segundo parágrafo se lê: “O Estado português não reconhece a soberania espanhola sobre o território oliventino e os portugueses não esquecem Olivença. A situação anómala de Olivença, exemplo de uma política que já não pode ser a do Século XXI, motiva um litígio que a ninguém beneficia e que tarda em ser solucionado”.
A provocatória saudação, que entre felicitações aos “valorosos ciclistas” e “especialmente aos oliventinos” dá ainda uma achega ao facto da ‘Vuelta’ não passar este ano pela Catalunha, País Basco e Galiza, começa a ser distribuída de mão em mão.
Há quem fique perplexo e não saiba o que fazer com aquele pedaço de papel em edição bilingue, e há quem o rasgue de imediato em mil bocados, lançando--os para o chão ao mesmo tempo que vocifera qualquer coisa em espanhol.
Apesar de Fernando Castanhinha jurar a pés juntos que muitos oliventinos desejam ser portugueses, percebe-se que o grupo até pode ser amigo de Olivença, mas Olivença não é muito amiga dele.
“As pessoas aqui vivem no silêncio. Parece que estão ainda sob o efeito do franquismo, têm medo de se manifestar, falam português dentro de casa mas na rua não arriscam, com receio de represálias”, adianta.
Em menos de três minutos, a própria população começa a apontar o dedo aos portugueses, num ápice rodeados por elementos da guardia civil.
A partir dessa altura destacam-se dois indivíduos: um tenente-coronel à civil, com cara de poucos amigos; e um elemento fardado, gordo, de bigodinho e óculos escuros Ray-Ban, modelo de 1970, capaz de resolver qualquer situação à lei da força. Este último bate violentamente na mão de Manuel Alonso, fazendo-o deixar cair os panfletos, enquanto o outro se mostra mais condescendente, apesar de alcançar os seus intentos e ficar com as missivas.
Segue-se uma acesa troca de palavras e nova ronda de identificação, que inclui os jornalistas. A partir dessa altura, registar uma conversa entre os portugueses e as forças da autoridade torna-se mais complicado do que ver McGyver construir um avião com um canivete suíço. Apercebendo-se de que o gravador está a funcionar, um guarda faz olhar de matador e manda parar a máquina: “Isso ainda está a gravar? Pára já com isso imediatamente”, dispara furioso. Respeito, liberdade e educação são conceitos inexistentes por aquelas bandas.
O pequeno grupo lusitano começa a ser olhado com desdém por muitos curiosos, alvo de um acompanhamento policial que nem os presos de Guantanamo devem ter. Para onde quer que se desloque, os agentes – e cidadãos mais ‘preocupados’ – seguem-no de perto, não vá o diabo tecê-las e começar ali uma acção conspirativa contra o Estado espanhol.
A AMEAÇA FINAL
O incidente com os panfletos e a eficácia policial deixaram Fernando Castanhinha e Manuel Alonso cabisbaixos. Metade da operação tinha ido por água abaixo, mas nem tudo estava perdido. Só a forma nervosa como a força da autoridade se manifestara já dava para ver o incómodo causado.
Perdidos dos elementos que tinham seguido viagem noutros carros, os dois arriscam ficar sozinhos e avançar para a segunda fase do plano: mostrar a bandeira portuguesa à passagem do pelotão. Fincam pé no passeio e conversam de forma descontraída, como se nada tivesse acontecido. Não fosse os dois polícias – o tenente e o gordito – estarem sempre a olhar para eles e parecia estar tudo a correr às mil maravilhas.
Fernando e Manuel esperam de saco plástico na mão até ao meio-dia, hora prevista para o arranque da 16.ª etapa da ‘Vuelta’. Sem falhas, os ciclistas começam a pedalar com pontualidade inglesa. Sobem a rua, uma recta comprida de visibilidade excelente, enquanto lá bem em cima, antes da curva à direita, os portugueses aguardam pelo melhor momento.
Quando passam os primeiros, abrem os sacos de plástico e deixam as cores nacionais darem outra alegria à festa. O gesto dura poucos segundos. Com uma rapidez felina, os dois polícias saltam para agarrar as bandeiras e começam as ameaças verbais e gestuais. “Aquele tipo fardado estava doido. Agarrou-me no braço com uma violência”, diz Manuel, minutos depois do sucedido, ainda com algumas marcas. “Chamou-me de tudo e chegou a afirmar que me batia”.
Os ânimos azedam a partir da chegada dos outros elementos do GAO a quem tinha sido confiscado o material subversivo: alguns oliventinos mais novos chamam nomes aos portugueses e gritam para que voltem para casa, que aquela não era a terra deles.
É isso mesmo que acontece. Já no jipe e pronto a fazer o trajecto de regresso, Fernando dá ainda uma volta pela cidade e interpela o presidente da edilidade. O homem dá pouca importância aos protestos e segue a sua vida, enquanto o português se indigna: “Isto é histórico e ridículo. Este é de certeza o único local do mundo onde a bandeira portuguesa não pode ser mostrada. Nem em Madrid ou Jacarta tal acontece. Dá bem ideia do défice democrático em Olivença”.
OLIVENÇA OU OLIVENZA?
Olivença escreve-se Olivenza desde aquele dia 20 de Maio de 1801, quando Espanha, com o apoio das tropas napoleónicas, conquistou, sem combate, a região até então pertencente a Portugal. A 6 de Junho a guerra chegava ao fim, com a assinatura do Tratado de Badajoz, no qual os espanhóis ficaram com o pedaço do território. Contudo, a 9 de Junho de 1815 a acta final do Congresso de Viena restitui-o a Portugal, ao retirar qualquer força jurídica a anteriores tratados. Nessa altura, ficou consagrada a ilegitimidade da retenção de Olivença por parte de Espanha. Na prática, isso nunca veio a acontecer. Por muito que seja nossa, ainda é deles.
A PONTE SEM NOME
Construída quando Durão Barroso era ministro dos Negócios Estrangeiros, a poucos metros da antiga ponte, a recente passagem sobre o Guadiana tem sido fundamental para estreitar relações com os oliventinos. Mas não deixa de causar polémica. O dirigente do PSD deu-lhe um carácter local, algo que enervou os espanhóis, já então pouco satisfeitos por ter sido edificada pelos portugueses. Por forma a evitar problemas diplomáticos maiores, o Governo nunca lhe deu um nome, ou qualquer indicação de que o que está do lado de lá ainda pertence a Portugal, assim como não se ouviram hinos na cerimónia de inauguração.
ÀS VOLTAS COM A 'VUELTA'
Depois dos atentados do 11 de Março, em Madrid, os eventos espanhóis são realizados com cuidados redobrados. Este ano, a Volta a Espanha em bicicleta evita zonas de possível tensão, como o País Basco, a Catalunha e a Galiza, com prejuízos visíveis para a prova. As etapas dos Pirenéus, normalmente alvo de grande atenção, passaram à história, tal o medo de um novo atentado. Mesmo quando a ETA está menos operante, mais vale prevenir do que remediar. Afinal, a al-Qaeda não tem fronteiras.
Expedição - 'Hermanos' mas pouco
OLIVENÇA AMORDAÇADA
Afinal Olivença é nossa ou é deles? Um punhado de portugueses decidiu invadir a cidade, para agitar a ‘vuelta’. Passaram as bicicletas, mas não passou a bandeira portuguesa – bastou um luso levantá-la, que logo lhe caiu em cima ‘la Guardia’.
Marta Vitorino
A comitiva foi sempre vigiada de perto pela polícia; e quando foi mostrada a bandeira aqueceram os ânimos.
À porta da Aula Magna, em Lisboa, Fernando Castanhinha não consegue esconder o crescente nervoso miudinho. Os primeiros raios de sol começam a despontar e o aumento do trânsito em Lisboa pode comprometer a chegada a tempo e horas a Olivença, zona de fronteira que tem há dois séculos dividido portugueses e espanhóis.
Secretário-Geral do Grupo dos Amigos de Olivença (GAO), associação com 600 elementos que tem vindo a reclamar a passagem da localidade para administração lusitana, o médico quer estar lá por volta das 10 horas (mais uma em Espanha), para presenciar a apresentação dos ciclistas da Volta a Espanha, que este ano, estranhamente, (ver caixa) passa por ali. “Marcámos a saída para as sete da manhã e vamos partir com meia hora de atraso. A malta tem de ser controlada com uma disciplina militar”, desabafa em tom de general minutos após mandar seguir um primeiro carro.
Minutos depois, e já com o jipe cheio, é a sua vez de pôr o motor a trabalhar e pisar no acelerador para compensar o tempo perdido. Bem feitas as contas, sempre consegue percorrer os mais de 200 quilómetros sem problemas, até porque conhece de cor o trajecto. Antes de em 1998 ter entrado para o GAO tinha ido apenas uma vez até àquela região, mas desde então somam-se viagens consecutivas.
A última aconteceu por altura do Euro’2004, quando na véspera da final frente à Grécia decidiu reunir as tropas e fazer uma visita inesperada: “Era uma ocasião única para, sob pretexto da final do evento, irmos lá entregar bandeiras portuguesas à descarada, sem que ninguém nos pudesse dizer nada. Comprei 50 e fomos ao mercado”. Embora ao início as pessoas estivessem hesitantes, a operação saldou-se num êxito, e nem os cachecóis escaparam.
A apoteose registada por essa altura dá alento suplementar para a viagem, embora sejam esperados problemas numa segunda visita em tão curto espaço de tempo. Poucos metros depois da ponte sobre o Guadiana, já do lado espanhol, seis agentes da guardia civil fazem a recepção de boas-vindas exigindo a amostragem dos Bilhetes de Identidade, seguida de uma breve vistoria à mala do veículo.
Mais importante que encontrar material ilícito, procuram algo que identifique a nacionalidade do grupo. Fernando consegue escapar ao controlo meio amador – o nome dos passageiros foi copiado para um pequeno bloco de notas –, mas a mesma sorte não tiveram os condutores de outros veículos, obrigados a entregar bandeiras, panfletos e cachecóis vermelhos e verdes.
“Eles agora fazem isto. Já da outra vez estavam aqui a controlar. Acho que desde o 11 de Março de Madrid que andam paranóicos com a possibilidade de novos atentados”, diz Manuel Alonso, pendura de Fernando na aventura, como que a tentar justificar tão rigoroso patrulhamento.
ALTA TENSÃO
Refeitos do primeiro teste aos nervos, Fernando Castanhinha e Manuel Alonso seguem viagem, avistando Olivença ao fim de uns minutos. Pelo curto caminho puxam da memória e dão lições de Geografia e História sobre todos os aspectos de uma população “pobre, subserviente e durante muitos anos votada ao esquecimento e à clausura”.
Estacionam perto de um café, não muito longe do local onde está instalado o palanque de apresentação dos ciclistas. Misturam-se entre a multidão e pouco antes dos ponteiros do relógio baterem as 10h30 sacam das resmas de panfletos onde no segundo parágrafo se lê: “O Estado português não reconhece a soberania espanhola sobre o território oliventino e os portugueses não esquecem Olivença. A situação anómala de Olivença, exemplo de uma política que já não pode ser a do Século XXI, motiva um litígio que a ninguém beneficia e que tarda em ser solucionado”.
A provocatória saudação, que entre felicitações aos “valorosos ciclistas” e “especialmente aos oliventinos” dá ainda uma achega ao facto da ‘Vuelta’ não passar este ano pela Catalunha, País Basco e Galiza, começa a ser distribuída de mão em mão.
Há quem fique perplexo e não saiba o que fazer com aquele pedaço de papel em edição bilingue, e há quem o rasgue de imediato em mil bocados, lançando--os para o chão ao mesmo tempo que vocifera qualquer coisa em espanhol.
Apesar de Fernando Castanhinha jurar a pés juntos que muitos oliventinos desejam ser portugueses, percebe-se que o grupo até pode ser amigo de Olivença, mas Olivença não é muito amiga dele.
“As pessoas aqui vivem no silêncio. Parece que estão ainda sob o efeito do franquismo, têm medo de se manifestar, falam português dentro de casa mas na rua não arriscam, com receio de represálias”, adianta.
Em menos de três minutos, a própria população começa a apontar o dedo aos portugueses, num ápice rodeados por elementos da guardia civil.
A partir dessa altura destacam-se dois indivíduos: um tenente-coronel à civil, com cara de poucos amigos; e um elemento fardado, gordo, de bigodinho e óculos escuros Ray-Ban, modelo de 1970, capaz de resolver qualquer situação à lei da força. Este último bate violentamente na mão de Manuel Alonso, fazendo-o deixar cair os panfletos, enquanto o outro se mostra mais condescendente, apesar de alcançar os seus intentos e ficar com as missivas.
Segue-se uma acesa troca de palavras e nova ronda de identificação, que inclui os jornalistas. A partir dessa altura, registar uma conversa entre os portugueses e as forças da autoridade torna-se mais complicado do que ver McGyver construir um avião com um canivete suíço. Apercebendo-se de que o gravador está a funcionar, um guarda faz olhar de matador e manda parar a máquina: “Isso ainda está a gravar? Pára já com isso imediatamente”, dispara furioso. Respeito, liberdade e educação são conceitos inexistentes por aquelas bandas.
O pequeno grupo lusitano começa a ser olhado com desdém por muitos curiosos, alvo de um acompanhamento policial que nem os presos de Guantanamo devem ter. Para onde quer que se desloque, os agentes – e cidadãos mais ‘preocupados’ – seguem-no de perto, não vá o diabo tecê-las e começar ali uma acção conspirativa contra o Estado espanhol.
A AMEAÇA FINAL
O incidente com os panfletos e a eficácia policial deixaram Fernando Castanhinha e Manuel Alonso cabisbaixos. Metade da operação tinha ido por água abaixo, mas nem tudo estava perdido. Só a forma nervosa como a força da autoridade se manifestara já dava para ver o incómodo causado.
Perdidos dos elementos que tinham seguido viagem noutros carros, os dois arriscam ficar sozinhos e avançar para a segunda fase do plano: mostrar a bandeira portuguesa à passagem do pelotão. Fincam pé no passeio e conversam de forma descontraída, como se nada tivesse acontecido. Não fosse os dois polícias – o tenente e o gordito – estarem sempre a olhar para eles e parecia estar tudo a correr às mil maravilhas.
Fernando e Manuel esperam de saco plástico na mão até ao meio-dia, hora prevista para o arranque da 16.ª etapa da ‘Vuelta’. Sem falhas, os ciclistas começam a pedalar com pontualidade inglesa. Sobem a rua, uma recta comprida de visibilidade excelente, enquanto lá bem em cima, antes da curva à direita, os portugueses aguardam pelo melhor momento.
Quando passam os primeiros, abrem os sacos de plástico e deixam as cores nacionais darem outra alegria à festa. O gesto dura poucos segundos. Com uma rapidez felina, os dois polícias saltam para agarrar as bandeiras e começam as ameaças verbais e gestuais. “Aquele tipo fardado estava doido. Agarrou-me no braço com uma violência”, diz Manuel, minutos depois do sucedido, ainda com algumas marcas. “Chamou-me de tudo e chegou a afirmar que me batia”.
Os ânimos azedam a partir da chegada dos outros elementos do GAO a quem tinha sido confiscado o material subversivo: alguns oliventinos mais novos chamam nomes aos portugueses e gritam para que voltem para casa, que aquela não era a terra deles.
É isso mesmo que acontece. Já no jipe e pronto a fazer o trajecto de regresso, Fernando dá ainda uma volta pela cidade e interpela o presidente da edilidade. O homem dá pouca importância aos protestos e segue a sua vida, enquanto o português se indigna: “Isto é histórico e ridículo. Este é de certeza o único local do mundo onde a bandeira portuguesa não pode ser mostrada. Nem em Madrid ou Jacarta tal acontece. Dá bem ideia do défice democrático em Olivença”.
OLIVENÇA OU OLIVENZA?
Olivença escreve-se Olivenza desde aquele dia 20 de Maio de 1801, quando Espanha, com o apoio das tropas napoleónicas, conquistou, sem combate, a região até então pertencente a Portugal. A 6 de Junho a guerra chegava ao fim, com a assinatura do Tratado de Badajoz, no qual os espanhóis ficaram com o pedaço do território. Contudo, a 9 de Junho de 1815 a acta final do Congresso de Viena restitui-o a Portugal, ao retirar qualquer força jurídica a anteriores tratados. Nessa altura, ficou consagrada a ilegitimidade da retenção de Olivença por parte de Espanha. Na prática, isso nunca veio a acontecer. Por muito que seja nossa, ainda é deles.
A PONTE SEM NOME
Construída quando Durão Barroso era ministro dos Negócios Estrangeiros, a poucos metros da antiga ponte, a recente passagem sobre o Guadiana tem sido fundamental para estreitar relações com os oliventinos. Mas não deixa de causar polémica. O dirigente do PSD deu-lhe um carácter local, algo que enervou os espanhóis, já então pouco satisfeitos por ter sido edificada pelos portugueses. Por forma a evitar problemas diplomáticos maiores, o Governo nunca lhe deu um nome, ou qualquer indicação de que o que está do lado de lá ainda pertence a Portugal, assim como não se ouviram hinos na cerimónia de inauguração.
ÀS VOLTAS COM A 'VUELTA'
Depois dos atentados do 11 de Março, em Madrid, os eventos espanhóis são realizados com cuidados redobrados. Este ano, a Volta a Espanha em bicicleta evita zonas de possível tensão, como o País Basco, a Catalunha e a Galiza, com prejuízos visíveis para a prova. As etapas dos Pirenéus, normalmente alvo de grande atenção, passaram à história, tal o medo de um novo atentado. Mesmo quando a ETA está menos operante, mais vale prevenir do que remediar. Afinal, a al-Qaeda não tem fronteiras.
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