terça-feira, agosto 25, 2020

UM VÍCIO «ANTIGO» DE INTOLERÂNCIA

Há trinta e tal, quarenta anos, era comum ouvir-se dizer «religião não se discute», como também se ouvia «política não se discute» e, mais tarde, por piada, «futebol não se discute». Pudera - quando se tem uma mentalidade formatada por um credo universalista e dogmático como a adoração do crucificado, dono da verdade, fica nas veias uma tendência natural, lógica, para impor aos outros a sua verdade e levar muito a mal a discordância opinativa. Pobre povinho português dessa época, ainda atrasado, acabado de sair do Estado Novo, ainda por cima não tinha nem internet nem computadores e em Portugal só havia um canal e meio de televisão, e ganhava-se cá uma miséria por mês, pobrezitos dos Portugueses. Nessa altura, o mordaz António Variações soube representar muito bem o comportamento «tuga» numa das suas letras: «Quando fala um português/ Falam dois ou três / Todos se querem escutar /Ninguém espera a sua vez/Ah! ninguém se quer calar/Pois tem direito a respeitar/Mas a conversa está a aquecer/Ai já estão a desconversar/Já ninguém se está a entender/Ai! Já estão todos a gritar/Ai! Que o insulto é de corar/A ameaça está no ar/E o punho está-se a fechar/Com tendência a piorar...»
Hoje isto aqui está mais evoluído, pelo que, quando as pessoas discordam umas das outras em conversas nesta sofisticada dimensão que é a Internet, pois quando isso acontece, ameaça-se e/ou bloqueia-se o interlocutor, ou denuncia-se a conversa à Inquisição do Facebook. A mesmíssima merda de há quatro décadas, mas agora em versão 2.0. A melhoria de mentalidades nunca é um produto do desenvolvimento tecnológico e científico, é só uma questão de mentalidade e de fundamentos doutrinais, tendencialmente independentes das conquistas técnicas.