domingo, novembro 26, 2017

CIDADÃOS QUE IRÃO QUESTIONAR O GOVERNO SOBRE DOIS ANOS DE GOVERNAÇÃO SERÃO PAGOS... QUEM OS SELECCIONOU?

Os cidadãos de vários pontos do país que vão este domingo fazer perguntas ao primeiro-ministro — no âmbito da comemoração de dois anos de Governo — vão ser pagos em vales de compras, garantiu ao Observador Jorge de Sá, da Aximage, empresa responsável pelo recrutamento dos participantes no evento. O jornal Sol noticiou este sábado que o Governo contratou uma empresa que irá pagar hotel, despesas e 2o0 euros aos cidadãos que aceitaram deslocar-se no domingo a Aveiro para questionar o primeiro-ministro António Costa. Ou seja: os contribuintes vão pagar o evento. Já há um ano o Governo pagou 11 mil euros, este ano pagará quatro vezes mais.
O contrato para este domingo, 26, foi feito com a Aximage por ajuste directo — terá um custo total de 45.202 euros (36.750 euros aos quais acresce IVA) — e consiste na aquisição de “serviços de recrutamento de participantes para integrar um estudo quantitativo e uma sessão pública no âmbito da iniciativa de avaliação do segundo ano em funções do XXI Governo Constitucional”. A sessão pública foi divulgada pelo Governo, que diz apenas estar a dar “cumprimento a uma das medidas do seu Programa que procura melhorar a qualidade da democracia (…): a avaliação anual do cumprimento das promessas presentes no programa de governo, com a participação de um grupo de cidadãos escolhidos aleatoriamente.”
A oposição já veio contestar esta sessão (que terá entre 50 a 70 pessoas) e exige que o Governo desista de a realizar. Jorge de Sá, da Aximage, não percebe a polémica em torno do assunto já que é “normal” quando se faz um “estudo” que haja um “estímulo para que as pessoas participem nesse estudo“. Quanto aos valores, Jorge de Sá explica que um evento em Lisboa, onde as pessoas não têm de se deslocar, normalmente as pessoas recebem “60 euros por estarem duas horas e meia num evento”. Ora, se a ida a Aveiro é 200 euros — valor que não confirma — Jorge de Sá considera um valor “absolutamente razoável“.
O responsável da Aximage — explica que não é o responsável directo por esse recrutamento — mas garante que esses 200 euros pagos aos participantes são pagos em vales de compras. “Só pode ser pago dessa forma, não tem lógica as pessoas passarem recibos verdes para participarem no evento“. Ou seja: as pessoas recebem um cheque-oferta. Este modelo é normalmente utilizado como incentivo para este tipo de estudos, podendo depois as pessoas deslocarem-se a retalhistas como o Pingo Doce, o Continente ou Minipreço (dependendo dos que têm acordo com a empresa de estudos) para efectuar compras com esse “cheque”.
Jorge de Sá diz que só mesmo por “provincianismo” é que se pode criticar um estudo destes. E garante que as pessoas são escolhidas de forma imparcial e de acordo com critérios objectivos. “Isto é feito de forma séria, não tem nada a ver com paquistaneses que se põem numa camioneta para ir a um comício“, atirou Jorge de Sá. Nas legislativas de 2011, recorde-se, indianos, paquistaneses e moçambicanos ajudaram a encher um comício de Évora da campanha de José Sócrates nas legislativas. Tinham sido transportados pela estrutura do PS desde o Martim Moniz, em Lisboa, até Évora, num caso que embaraçou a estrutura socialista.
A Aximage nega ainda que o pagamento tenha alguma relação com as perguntas que serão feitas aos participantes, já que essa parte será totalmente controlada pelo responsável pelo Departamento de Ciências Políticas da Universidade de Aveiro. Há um ano, o Governo já tinha utilizado o mesmo esquema, mas em vez do ajuste directo ser feito com uma empresa (a Aximage) foi feito com uma universidade: o Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa.
De acordo com um ajuste directo publicado no Portal Base, o Governo já em 2016 — para o mesmo esquema de painel de perguntas de cidadãos, quando o Governo completou um ano — pagou pela “aquisição de serviços de desenho, realização e moderação de Grupos Focais no âmbito da iniciativa de avaliação do primeiro ano em funções do XXI Governo Constitucional“. A sessão de 2016 foi então coordenada por Marina Costa Lobo.
Já há um ano essa contratação incluía a “definição do perfil dos participantes a integrar os Grupos Focais”; a “definição dos tópicos a abordar pelos Grupos Focais”, a “realização de Grupos Focais”, o “acompanhamento e moderação dos Grupos Focais durante o evento” e ainda a “elaboração de um relatório final com as principais conclusões de cada Grupo Focal realizado, o qual deve[ria] ser entregue no final do evento”.
O PSD, através do antigo líder parlamentar Luís Montenegro, lançou este sábado “um desafio muito directo ao primeiro-ministro e que deve ter uma resposta muito prática: que cancele esta sessão, esta encenação vergonhosa“. Luís Montenegro sublinhou que está em causa “uma reunião formal de um órgão de soberania, não uma acção partidária ou de alguma associação”. Luís Montenegro considera que a sessão é “imoral, porque se está a condicionar, para não dizer comprar, a opinião pública; indigna, porque envolve a realização de um Conselho de Ministros nesta operação, e de uma ligeireza total, porque o Governo assume que os contribuintes pagam“.
Luís Montenegro sugere que este é um regresso de um velho PS, dizendo que a acção “deve ser inspirada na universidade do engenheiro Sócrates, de que António Costa era discípulo, que contratava meninos para mostrar computadores“.
Na mesma linha, a líder do CDS, Assunção Cristas, disse que se o Governo “tivesse um pingo de vergonha (…) não faria a sessão que está a pensar fazer com recurso às ditas pessoas contratadas.” E também recuperou os tempos de Sócrates e até os caso dos cartazes de Costa, revelado pelo Observador em 2015: “Nós recordamo-nos bem de um outro primeiro-ministro, também do Partido Socialista, que contratou crianças como figurantes para uma sessão pública. Sabemos agora que amanhã [domingo] aparentemente também terão sido contratadas pessoas, de resto como apareceram nos cartazes na campanha de 2015 e que nada tinham a ver com a realidade.”
A sessão de perguntas decorre amanhã, às 15h00, no hall da reitoria da Universidade de Aveiro. Cidadãos de todo o país vão fazer questões ao primeiro-ministro no âmbito do balanço de dois anos de mandato do Governo. A partir das 11 horas, realiza-se uma reunião do Conselho de Ministros no mesmo local.
O Observador tentou, sem êxito, contactar o coordenador da sessão e o professor da Universidade de Aveiro, Carlos Jalali.
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Fonte: http://observador.pt/2017/11/25/cidadaos-que-vao-fazer-perguntas-a-costa-pagos-em-vales-de-compras/

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Na melhor das hipóteses, o processo é pouco transparente, o que em Democracia não fica nada bem - quem escolheu os cidadãos que vão fazer as perguntas e com que critérios? Houve participação da oposição nessa escolha? Pelos vistos não...