SOBRE O ALVOR DA LUZ INVICTA
Relevo encontrado em Tróia de Setúbal, datado de entre 200 e 250 d.e.c., representando o banquete do Sol (ao centro) e de Mitra (à direita, com barrete frígio)
[M(ithrae)?] DEO INVICTO / SODALICIV(m) BRACA/RORVM STVDIVM SVAPENSA [sic] FECERVNT CVM (hedera) / 5 CRATERA TI[TVLVM?]’ DONA/VIT MESSIVS [M(arci) L(iberiiis)] [?] [ARTEJMIDO/RVS MAGISTER · [C(oloniaê)?] (hedera) P (acis?) (hedera) I (uliae?) (hedera )
"A Mitra (?), Deus Invicto. O sodalicio dos Brácaros fizeram (sic) a expensas suas um edifício com uma crátera. Méssio Artemidoro, liberto de Marcos (?), magistrado da Colónia de Pax Iulia (?), doou a inscrição."
"Sobre esta inscrição que está no Museu de Beja José d’Encarnação afirma: o texto assume uma importância documental ímpar, por ser «a única inscrição da Península que nos dá a conhecer uma organização mitríaca». De facto, para além do facto concreto que o monumento comemora e que, segundo a nossa interpretação, foi mandado perpetuar pelo magister de Pax Iulia através desta placa por ele doada (donavit resta evidente — como todos os autores já salientaram — que em Beja existiu em determinada altura (2.a metade do séc. II, precisa Scarlat Lambrino) um colégio de Brácaros devotos de Mitra, colégio ou tertúlia que, como salienta G. Fabre «devia permitir às gentes originárias de Brácara, que fossem aconselhadas e defendessem, se fosse caso disso, os seus interesses»."
Dia 25 de Dezembro é data da celebração do Natalis Solis Invictus, isto é, do Nascimento do Sol Invencível, o momento em que o SOL inicia a Sua ascensão triunfante, representando, neste momento, a Luz que nunca morre e vence sempre. A celebração foi estabelecida em 274 e.c., pelo imperador Aureliano, depois do seu triunfo no oriente, e incluía corridas de cavalos - trinta bigas - em honra do Sol. O Sol Invicto, Luz que nunca morre e vence sempre, é pois um reflexo da Eternidade.
O dia 25 de Dezembro é também a data do nascimento de Mitra, Guardião da Justiça, Cujo culto, vindo da Índia e do Irão arianos, chegou ao Império Romano no século I a.c. e aí se divulgou imensamente, desde a Ásia Menor até à Ibéria - parece ter havido um templo mitraico em Tróia de Setúbal, foi aí encontrado um baixo-relevo que representa provavelmente uma cena dum banquete mitraico, neste momento exposta no Museu Nacional de Arqueologia, na exposição «Religiões da Lusitânia».
A Ibéria foi o território europeu com menos culto a Mitra na maior parte do espaço peninsular, excepto no noroeste, devido à presença aí de numerosos soldados romanos para dar resposta à relativa instabilidade da zona, em virtude do carácter mais indómito das gentes dessa região. Mitra foi portanto bem mais adorado no resto do Ocidente, nomeadamente na Gália, na Britânia e sobretudo na Germânia, que na Hispânia. Mitra, ou Mithras, Cujo nome significa, em Sânscrito (língua ariana da Índia), «Amigo»; em Persa, o mesmo nome quer dizer «Contrato». Trata-Se de um Deus luminoso, puro, combativo, que incita os homens a seguirem o Seu caminho no combate pela Luz contra as Trevas. O Seu culto confundiu-se, no Ocidente, com o do Sol Invictus, ou Sol Invencível; Mitra tem naturalmente um forte carácter solar (o que não significa que seja o Sol) e o Seu dia sagrado é o domingo (no Latim pagão, domingo é «Dies Solis», ou «Dia do Sol»). De acordo com algumas versões, Mitra nasceu duma pedra, o que constitui um símbolo da sua pureza; segundo outros, é filho duma virgem. Diz o mito que o Deus Máximo, Ahura Mazda, Lhe ordenou que matasse o toiro. O Sol foi o mensageiro que levou esta ordem a Mitra, O Qual a cumpriu, conseguindo levar o animal para uma caverna onde o sacrificou (por esse motivo, os fiéis de Mitra oficiavam as suas cerimónias religiosas em cavernas). Do sacrifício do toiro, o universo é renovado, pois que o sangue do bovino será o vinho e todo o seu corpo alimenta o cosmos, dando, entre outras coisas, o pão. A alma do toiro sacrificado subiu então aos céus para ficar junto do Deus Supremo. Depois de cumprida a Sua missão, Mitra realizou um banquete com os Seus fiéis, comendo pão e vinho, findo o qual ascendeu aos céus.
A religião mitraica compreendia uma iniciação de sete graus. Em cada grau aprender-se-iam novos e secretos conhecimentos. Tinha um carácter hierárquico e era vedada às mulheres. Os graus eram:
- corax (corvo);
- nymphus (noivo);
- miles (soldado);
- leo (leão);
- perses (persa);
- heliodromos (correio do Sol);
- pater (pai).
Mithraeum (reconstrução) ou templo de Mitra, em Saalburg num forte romano do chamado «Limes Germanicus», isto é, o limite ou fronteira da província romana da Germânia, Alemanha
Reconstrução de como seria o interior de um mithraeum ou templo de Mitra
É uma religião de soldados, de homens integrados num exército que cumprem ordens e são leais uns aos outros até que a morte os leve para o Outro Mundo.
Muito mais há a dizer sobre esta Divindade, valendo a pena lembrar as palavras de Renan, historiador bretão («francês») do século XIX segundo o qual «Se o Cristianismo tivesse sido detido por alguma doença mortal, o mundo seria mitraísta», observação que é de resto discutível, dada a parcialidade do culto - só iniciava homens - e ao carácter talvez acentuadamente oriental do mesmo, enquanto o seu grande inimigo, o Cristianismo, tendo uma índole porventura mais desenraizada e universalista, a tudo se adaptou.
Para ter mais umas luzes sobre o tema pode por exemplo visitar-se este site dedicado ao culto de Mitra na actualidade:
6 Comments:
Aí está, os Romanos do ponto de vista religioso eram do mais tolerante possível, sendo que o Mitraísmo e o Cristianismo eram apenas mais duas religiões a juntar à panóplia vinda do pós-Helenismo. O problema do Cristianismo foi a sua inassimilabilidade social. De início, foi apenas vista como uma variante do Judaísmo, logo "religio licita". Quando começou a revelar a sua faceta "ateísta", não alinhando no culto ao Imperador, é que começaram os problemas.
No mais, Roma já estava acostumada a assimilar e adaptar credos orientais, vide por ex., o culto de Ísis, entre outros.
Exactamente. Os Romanos estariam dispostos a aceitar o Cristianismo como mais um credo, igual aos outros; o Cristianismo é que, por natureza, não aceitava tal coexistência.
Como se os cristãos tivessem alguma obrigação de prestarem culto ao imperador.facepalm
Como se os pagãos tivessem alguma obrigação de aceitar quem no seu seio pregava o ódio aos Deuses e instigava à subversão... muita sorte tiveram os cristãos em não serem sumariamente varridos. No Japão já foi diferente, aí não brincaram, foram rapidamente massacrados e acabou-se-lhes a festa, não houve o «milagre» da conversão do povo...
Poucas perseguições romanas houveram contra os cristãos, sim, senhor...e menos sorte tiveram os druídas às mãos dos romanos, também deviam pregar o ódio aos deuses. facepalm
Não, esses só pregavam o ódio a Roma, além de realizarem sacrifícios humanos. Coisa pouca... Quanto aos cristãos, coitadinhos, foram tão mas tão perseguidos que afinal veio-se a descobrir que a maior parte das perseguições de que teriam sido vítimas... foi treta e afinal foram é muito pouco perseguidos... mesmo que andassem literalmente a pedi-las, algumas vezes caindo no ridículo de pedirem para serem supliciados.
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