terça-feira, julho 29, 2014

UM DOS MAIS DESTACADOS TEÓLOGOS DA CRISTANDADE FALA SOBRE A VERDADEIRA RELIGIÃO DO OCIDENTE

Nada poderia ser mais falso do que tornar o cristianismo a religião do Ocidente. É, digamos, de outra ordem. Não é uma religião do Ocidente. Esta, a do Ocidente, é o antigo paganismo grego ou latino, celta ou germânico. E foi o equivalente ao que são o animismo ou as religiões americanas, o Hinduísmo e o Taoísmo. É a Plotino que se pode comparar o Shankara, e Marco Aurélio a Confúcio. Os paganismos equivalem-se. Não estão muito longe de nós. Nunca somos mais do que pagãos convertidos - Fiunt non nascuntur Christiani, disse Tertuliano. Que pode ser traduzido assim: "Nasce-se pagão, depois vem-se a ser cristão." O génio religioso do Ocidente determina o modo ocidental de ser cristão. E nós temos o dever de ser fiel a ele. Mas não para impô-lo aos outros.
Há, portanto, várias almas pagãs. E cada uma tem a sua beleza. E todas merecem ser salvas. E todas serão realmente salvas. Foi-o a alma pagã dos Semitas que está em Abraão. Foi-o a alma pagã ocidental, o baptismo de Platão e Virgílio. Sê-lo-á no século XX a alma pagã africana, e a alma pagã indiana no século XXI. As diversidades do Cristianismo são reflectidas na unidade de uma fé que é necessariamente una, da diversidade das almas religiosas que acolhem esta fé cada qual à sua própria maneira. E que direito tenho de impor aos outros a minha maneira de acolher Jesus Cristo?

Jean Daniélou, L'oraison, problème politique,1965.
Fonte: http://anarchrisme.blog.free.fr/index.php?post/2013/07/28/Le-christianisme-et-et-les-%C3%A2mes-pa%C3%AFennes

Daniélou, teólogo jesuita, cardeal, membro da Academia Francesa, apontado pelo papa como consultor para o Concílio Vaticano II, evidencia uma cristalina objectividade no que diz sobre a(s) verdadeira religião(ões) do Ocidente. Pode argumentar-se que está aqui simplesmente a servir a causa da cristianização do mundo de uma forma flexível e cheia de boas aparências tolerantes, e de facto é isso mesmo que parece estar a fazer, dizendo aceitar a diversidade das almas mas pressupondo, como bom imperialista espiritual, que a integração na Cristandade é alguma espécie de sentido único, o que faz um bocado lembrar, mal comparado mas correcto no essencial, o que dizia Ford, que «toda a gente pode escolher a cor que quiser para o seu automóvel desde que escolha preto». Nada de surpreendente quando expresso ou insinuado por um cristão. Salienta-se, ainda assim, e mais uma vez, a lucidez e porventura a relativa coragem com que fez notar que a verdadeira alma do Ocidente é pagã e que por isso a religiosidade autenticamente ocidental não é, como se tornou hábito pensar, a adoração do carpinteiro morto na cruz mas sim o culto aos Deuses da herança étnica europeia. Deste modo poderia parecer a alguns que dava um salto no ar sem rede por baixo, dado que voluntariamente prescinde de um dos principais argumentos que os cristianizantes modernos têm usado para convencer as Europas de que um europeu tem que ser cristão porque já o é e tal e coisa - houve até mesmo quem dissesse que o europeu é cristão «quer queira quer não.» Daniélou lixa-os. A partir daí, e num contexto cultural e social já um pouco diferente do da sua época, porquanto a Cristandade perde hoje fiéis europeus a alta velocidade, e de há vinte e tal anos para cá perde todas as batalhas político-sociais em que se mete (aborto, casamento gay, eutanásia, etc.), a partir daí, dizia, nada de nada justifica que a dita alma ocidental pagã tenha de ser «integrada» numa religião que lhe é estrangeira, pois que, diga-se o que se disser, foi produzida pela alma semita e consiste na adoração de uma Entidade igualmente semita.

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Ave! Ainda acho o discurso ortodoxo tradicional mesmo perigoso do que o deste francês mais flexível e tendente a integração. Este tipo de postura tende a fazer crescer o cristianismo.

30 de julho de 2014 às 01:20:00 WEST  

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