sexta-feira, maio 20, 2016

SOBRE A ATITUDE DE APOIO DO ANTERIOR LÍDER DO CDS A UM REGIME OPRESSIVO NORTE-AFRICANO

O Crans Montana Fórum, S.A.M. com o seu executivo sediado na Suíça, é uma sociedade anónima monegasca. Este ano, tal como no ano passado, realizou mais um dos seus eventos (muito semelhante ao Fórum Económico Mundial) em Dajhla (17 a 22 de Março de 2016), sob o auspício do monarca marroquino Mohamed VI. Paulo Portas marcou presença neste “dúbio” evento com um discurso no mínimo grotesco.
Contudo nada disto seria digno de consideração, não fosse o facto de Dajhla ser uma cidade do Sahara Ocidental, ocupado ilegalmente por Marrocos deste 1975. Ocupado pela força, em flagrante violação do Direito Internacional e dos Direitos Humanos.
O Sahara Ocidental é um território pendente de descolonização (Espanha), ocupado a ferro e fogo, por um ocupante (Marrocos) a quem nem as Nações Unidas nem nenhum país do mundo reconhecem qualquer tipo de soberania sobre aquele território. Marrocos despreza as resoluções das Nações Unidas, a MINURSO* e os pedidos da União Africana que sem sucesso não se poupam a esforços para que seja realizado um referendo de auto-determinação dos Saharauis por forma a terminar esta longa (40 anos) e dolorosa espera.
Marrocos, sem escrúpulos, prefere o status quo, agravando a vida de todos os que vivem quer nos territórios ocupados do Sahara Ocidental, quer nos acampamentos de Tindouf, na Argélia onde se refugiaram e vivem em precárias condições.
É (a meu ver) mais uma infrutífera tentativa de Mohamed VI para legitimar uma ocupação que em tudo viola os direitos humanos dos Saharauis. Em momento algum o Crans Montana Fórum pediu opinião ao Presidente da Republica Árabe Saharaui Democrática, Sr. Mohamed Abdelaziz para a realização deste evento em terras Saharauis.
Se no ano passado ficámos com dúvidas este ano temos certezas.
Paulo Portas: “Mohamed VI foi e é um reformador previdente e até visionário”
Paulo Portas esteve mesmo neste Fórum que com pouca cobertura mediática, tentou passar despercebido, ou ter uma mais ampla difusão. O que na realidade não é de estranhar, face aos contras que superavam de longe os prós.
Segundo o “Diário de Notícias” (20 de Março de 2016), Paulo Portas disse que "em Marrocos existe um modelo político singular: o Rei é ao mesmo tempo Comandante dos Crentes”, considerou o país “o bom exemplo da democracia” e afirmou: “Mohamed VI foi e é um reformador previdente e até visionário”.
É quase impensável acreditar que o ex-líder do CDS desconheça a realidade dos marroquinos, para quem a democracia não passa do “jugo” forte da mão de Mohamed VI. Que Marrocos é um dos países mais ricos do Mundo, mas que o poder está todo nas mãos do monarca enquanto a maior parte da sua população continua a viver na miséria.
Marrocos é um país envolto na aparência de um sistema económico normal, bancos, empresas, sector privado, mas onde o rei é o principal banqueiro, o principal segurador, o principal exportador e agricultor, controlando da mesma forma os sectores agro-alimentar e a sua distribuição.
Uma parte da sua riqueza é gerada através da exploração e “saque” dos recursos naturais do Sahara Ocidental, tais como os fosfatos e a pesca.
Obviamente que por motivos bem diferentes, mas numa coisa tenho que concordar com o Sr. Paulo Portas: “Marrocos devia constituir uma prioridade europeia".
Sem dúvida. A Europa e em geral a comunidade internacional devem sim mobilizar-se para apoiar mais e mais os Saharauis. Divulgar a sua causa e a sua luta, mostrar os atropelos e barbáries acometidas contra eles, diariamente, e caminhar, lado a lado, para a sua tão merecida auto-determinação. Devemos sim, pressionar as Nações Unidas para fazerem cumprir os seus propósitos, pilares dignos e firmes contra a opressão dos povos, promovendo a paz e segurança, desenvolvimento e direitos humanos.
Se Paulo Portas tivesse comparecido neste Fórum, para discursar contra a opressão de Marrocos sobre o Sahara Ocidental, sobre a violação dos princípios da declaração da Carta das Nações Unidas.
Ao invés de ter falado muito ao de leve na questão do Sahara Ocidental, Paulo Portas afirmou: "não devemos envolver-nos em questões sensíveis, mas algo superadas pelo tempo - por exemplo o Sahara Ocidental - devemos antes promover, tanto quanto possível, o diálogo entre Rabat e Argel”. A Frente Polisario nem é sequer mencionada...
Porque eu tenho a certeza que a questão do Sahara Ocidental não é “algo” que se supere com o tempo, mas sim com atitudes assertivas. Com o tempo, Sr. Paulo Portas, irão certamente sarar as feridas dos Saharauis que ao longo destes 40 anos perderam familiares, vítimas de desaparecimentos forçados e dos que pereceram diante da mão do opressor marroquino.
Com o tempo irão seguramente sarar as feridas dos detidos por julgamentos arbitrários, dos que vivem nos acampamentos e de muitos deles que lá nasceram e não conheceram outra vida senão aquela. Dos que vivem diariamente no exílio e de todos os que aos dias de hoje sofrem as piores atrocidades nos territórios ocupados do Sahara Ocidental!
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Fonte: http://www.esquerda.net/artigo/paulo-portas-elogia-rei-de-marrocos-e-diz-que-questao-do-sahara-esta-ultrapassada/42375   (Artigo originariamente redigido sob o acordo ortográfico de 1990 mas corrigido aqui à luz da ortografia portuguesa.)

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Já se sabe que com o mal dos outros, e dos fracos, está a «Direitinha» bem... e se entretanto estabelece negociatas com opressores e depois um dia a casa dos mesmos vem abaixo, é porque houve azar ou, quem sabe, movimentação de forças contrárias e pronto...