QUEM JULGAVA QUE SER DA OTAN NUNCA TRARIA COMPROMISSOS?
À medida que vozes destas se vão ouvindo um pouco por toda a Europa, instala-se nos ares sociais europeus um mal-estar que inclui, não apenas o temor pela morte de familiares, mas também um compreensível e mui humano cagaço pelo seu próprio bem-estar.
Seria realmente uma chatice ter de ir esticar o pernil em cascos de rolha com sonoridade eslava.
Esperemos que não se chegue a isso - e, caso a situação no leste europeu se agrave, esperemos igualmente que as tropas portuguesas estejam porventura entre as últimas a ser chamadas - ou se calhar têm todos os Estados membros de participar de forma proporcional desde o início de qualquer conflito, não sei. Acho simplesmente que é pouco provável vir tal coisa a ter lugar.
Quanto ao almirante, pois diz o que tem a dizer como militar, que mais poderia ele fazer?, é a sua função. Não sei se a sua declaração que se lê na imagem foi da sua iniciativa ou se de uma simples resposta a uma pergunta se tratou. De qualquer modo, está dentro do que lhe compete.
A reacção de muitos portugueses ao que destarte ouviram da boca deste chefe nacional dos marinheiros armados deve ter sido análoga à reacção de outros tantos (se calhar mais em número) portugueses que há sessenta e tal anos ouviram o botas de Santa Comba dizer «para Angola rapidamente e em força!» (ou, mais concretamente, «andar rapidamente e em força» no contexto do envio de tropas portuguesas para Angola).
Em ambos os casos, o de 1961 e o de um possível futuro próximo, os patriotas salazaristas coerentes e de boa memória sabem que é uma questão de dever... ao fim ao cabo, foi o Estado Novo que meteu Portugal na OTAN e um português honrado cumpre os seus compromissos... claro que, para alguns entusiastas do império, é muito mais apelativo impor os telhões lusos em cima das trombas dos elefantes africanos do que ir safar o coiro de outros europeus em posição de igualdade para connosco, mas a vida é como é, e em África houve uns quantos que começaram a achar que também tinham direito àquilo que os Portugueses exigiram para si próprios em 1071, em 1128, em 1143, em 1383, em 1640 e em 1808... se calhar receberam tanto da nossa cultura que resolveram imitar-nos, se calhar foi isso, ou então foi só a gigantesca distância identitária entre nós e eles que os pôs em marcha...
Vá lá que, pelo menos desta vez, em solo europeu, os portugueses que tombassem em combate, fá-lo-iam em ambiente mais bonito e mais fresquinho, sem insectos, e rodeados de caras europeias (e se calhar algumas asiáticas). Menos mal.
Acresce que é incomparavelmente maior a proximidade entre os Portugueses e todos os Povos do leste europeu do que a proximidade entre os Portugueses e qualquer Povo africano.
De resto, já se sabe -
para além dos laços étnicos que unem todos os Indo-Europeus,
e dos laços civilizacionais e políticos que unem todos os Europeus,
há ainda a questão da mais elementar conveniência.
Portugal ganha mais em ser membro da mais poderosa aliança militar do mundo do que em o não ser - o mais provável é que não aconteça nada para além das actuais tensões; no improvável caso de conflito militar aberto entre as forças do Atlântico Norte e as dos putinetes, sucederia porventura que os drones, os mísseis e os soldados anglo-saxónicos, polacos, baltas, teutónicos e gauleses seriam porventura muito mais utilizados do que os lusos; por outro lado, isto é como todas as relações humanas, uma troca: na ainda mais improvável, altamente improvável mesmo, eventualidade de uma Espanha liderada pelo VOX invadir algum território português, gostaríamos de ter a OTAN a bloquear o conflito entre dois Estados membros, impedindo que os 70 Eurofighters Typhoon e os 82 F-18 Hornet da Força Aérea Espanhola entrassem em combate com os 28 F-16 Fighting Falcon da FAP; na também muito improvável embora não tão improvável mas ainda assim sobejamente improvável situação de um governo islamista tomar conta de Marrocos, ou da Argélia, e declarar que nem Portugal nem Espanha tiveram alguma vez direito de existir, e resolvessem por exemplo invadir a Madeira, só para começar, pois nessa altura a OTAN dar-nos-ia muito jeito, digo eu - e, sem ela, chapéu, o arquipélago madeirense seria para Portugal como Goa, Macau e Timor. Nada aconselhável.
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home