quarta-feira, abril 09, 2014

COMO OS PLUTOCRATAS SE APROVEITAM DOS TRIBUNAIS EM PORTUGAL - ESTADO PERDE DEZENAS DE MILHÕES EM PRESCRIÇÕES

Fonte: http://www.ionline.pt/artigos/portugal/contra-ordenacoes-estado-perde-72-milhoes-euros-devido-prescricoes-0/pag/-1
através de http://www.forumnacional.pt/index.php?topic=540.new#new

A prescrição da multa de 1 milhão de euros de Jardim Gonçalves apontou de novo os holofotes à demora das investigações e dos tribunais, mas o caso de Jardim Gonçalves não é o único em que o Estado não conseguiu arrecadar o dinheiro das coimas. Além deste, de uma lista de 13 processos movidos pela Comissão de Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), Banco de Portugal (BdP) e Autoridade da Concorrência (AdC), e que o i analisou, há cinco em que pelo menos algumas das contra-ordenações prescreveram e três que correm o risco de prescrever. Ao todo, o Estado já perdeu pelo menos 72 milhões de euros por culpa das prescrições. E, com os que estão em risco, arrisca-se a perder um total de 86 milhões.
O caso movido contra a PT e a ZON por suspeitas de abuso de posição dominante no mercado de acesso de banda larga, por exemplo, nem chegou a ser analisado a fundo pelos tribunais: as coimas de 53 milhões de euros nunca foram pagas porque o Tribunal do Comércio acabou por declarar a prescrição das contra-ordenações em 2011. O caso esteve seis anos a ser investigado pela AdC.
As suspeitas de cartel nas cantinas foram investigadas pela mesma autoridade administrativa, mas aqui a demora acentuou-se entre recursos e tribunais. O supervisor aplicou coimas de 14,7 milhões de euros, as empresas pediram diligências complementares de prova e o Tribunal do Comércio, depois de mais de um ano, obrigou a AdC a fazer uma nova acusação. Em 2013, a prática de cartel foi dada como prescrita. As empresas de restauração ainda lutam em tribunal para que a contra-ordenação mais leve, por troca de informações, também o seja.
Em 2006, a AdC multou a SIC e a PT Multimédia em 3 milhões por considerar que um acordo estabelecido entre as duas empresas restringia a concorrência no mercado da televisão por cabo. O julgamento começou no início de 2007. Em Julho, o tribunal declarou a nulidade do processo. Recurso após recurso, o processo acabou por prescrever em 2009.
A prescrição foi também o destino de algumas infracções investigadas no processo de suspeitas de concertação de preços das farmacêuticas em concursos públicos e da coima de 180 mil euros aplicada pelo BdP a Tavares Moreira por informações falsas e falsificação das contas do Central Banco de Investimento. A Relação anulou o julgamento e já foi tarde de mais para evitar o veredicto "prescrito".
Esta quinta-feira, Carlos Tavares, presidente da CMVM, disse no parlamento que estes desfechos não se resolvem apenas com o aumento dos prazos prescricionais: é necessário limitar o número de testemunhas abonatórias e ter mão mais pesada perante as entidades bancárias que mintam ao supervisor durante a investigação. Tavares considerou ainda "lamentável" e "desrespeitosa" a forma como os juristas e as testemunhas da CMMV são tratados em tribunal e frisou que "a supervisão barata às vezes sai cara". Pelo caso principal do BPP, que ainda não tem acusação, já terão passado quatro juristas da CMVM.
Outro processo de contra-ordenação do BPP assombrado pelo risco da prescrição é o que foi movido pelo BdP. Rendeiro e outros ex-administradores daquela instituição bancária foram condenados a pagar 11 milhões de euros por, entre outras alegadas irregularidades, falsificação de títulos. O dinheiro ainda não foi pago e Rendeiro argumenta nos tribunais que parte das irregularidades praticadas entre 2002 e 2008 já terão prescrito. Oliveira Costa está a seguir a mesma estratégia: condenado a pagar uma coima de 75 mil euros, aguarda decisão final sobre a prescrição, depois de a 1.a instância ter dito que os factos estavam prescritos e a Relação ter declarado o inverso.

BCP: Processo movido pela CMVM contra o banco
Datas dos factos: 2004
Início da Investigação: 2007 (três anos e meio após o primeiro facto)
Acusação supervisor: 2008
Recurso: 2009
Julgamento (1.ª instância): 2010
Sentença (1.ª instância): 2010
Recurso para Relação: 2011
Acórdão Relação: 2011
Recurso para Constitucional: 2011
Acórdão Constitucional: 2012 (rejeitando questões suscitadas pelo arguido)
Conclusão. Tribunais deram total razão à CMVM

BCP: Processo movido pela CMVM contra nove ex-administradores 
Datas dos factos: de 2004 a 2007
Início da investigação: 2007
Acusação supervisor: 2008 contra 11 arguidos
Condenação supervisor: 2010 (2 são absolvidos)
Julgamento (1.ª instância)/Fim do processo: em 2009 foi negado recurso pelo Tribunal de Pequena Instância. Em 2010 é apresentado novo recurso por suspeita de imparcialidade do presidente da CMVM
Decisão (1.ª instância):2013
Recurso Relação: 2013
Decisão Relação: 2014 (arguidos apresentaram requerimento da decisão)

BCP: Processo movido pela CMVM contra BCP sobre perdas de pequenos accionistas 
Início da investigação: 2006
Acusação supervisor: 2008
Julgamento (1.ª instância): 2008
Proferido despacho (1.ª instância): 2010 declarar prescritas as contra ordenações
Recurso apresentado pela CMVM do despacho para a Relação: 2010
Decisão (1.ª instância): 2010 Absolvição total do BCP
Recurso da CMVM da sentença para a Relação: 2010
Acórdão Relação: 2010 Absolveu BCP de violar as suas obrigações para com o supervisor e ordenou o reenvio para novo julgamento da violação do dever de conservadoria (guardar contratos com pequenos accionistas)
Início de julgamento (1.ª instância): 2012
Sentença 1.ª instância: 2012 (absolveu BCP)
CMVM e MP recorrem para Relação: 2012 (ainda aguarda decisão final da Relação)

BCP: Processo movido pelo BdP contra ex-administradores 
Datas dos factos: 1999 a 2007
Início da investigação: 2007
Condenação Supervisor: 2010
Julgamento (1.ª instância): 2011
Decisão (1.ª instância): em 2011, juiz decide nulidade do processo
Recurso da CMVM para a Relação: TR revoga decisão primeira instância. O TC teve o mesmo entendimento. É ordenado continuação de julgamento
Recusa 1.ª instância: 2014 juiz declara-se incompetente para a julgar o caso, mas Relação ordenou que continuasse. Nesse seguimento o juiz decidiu declarar prescrição relativamente a Jardim Gonçalves. Julgamento prossegue quanto a restantes arguidos
BPN –
 Oliveira Costa
Datas dos factos: 1999 a 2007
Início da investigação: 2007
Condenação supervisor: 2010
Julgamento (1.ª instância): 2011
Decisão (1.ª instância): em 2011, juiz decide nulidade do processo
Recurso da CMVM para a Relação: TR revoga decisão primeira instância. O TC teve o mesmo entendimento. É ordenado continuação de julgamento
Recusa 1.ª instância: 2014 juiz declara-se incompetente para a julgar o caso, mas Relação ordena que continue. Nesse seguimento o juiz decidiu declarar prescrição relativamente a Jardim Gonçalves. Julgamento prossegue quanto a restantes arguidos.

BPP
João Rendeiro 
Data dos factos: Entre 2002 e 2008
Início da investigação: Banco de Portugal começou a investigar em 2009
Condenação do BdP: BdP multa em 2013, 11 arguidos em 11 milhões de euros 
Recurso de Rendeiro: em 2014 recorre para o Tribunal da Concorrência e Regulação, argumentando que quando se tornou arguido alguns factos já teriam prescrito 
O que está em causa: suspeitas de falsificação de títulos durante a anterior gestão do BPP.

Moagens de cereais
Data dos factos: entre 2000 e 2004
Início da investigação: 2004
Condenação da Autoridade da Concorrência: 2005
Anulação pelo Tribunal do Comércio: 2008
Nova decisão da AdC: 2009. Condena 11 empresas de moagem a coimas de 9 milhões de euros
O que estava em causa: combinação de montantes dos aumentos e das descidas de preços do pão entre as empresas de moagem

Armando Esteves Finibanco 
Data dos factos: 2008
Início da investigação: 2009
Condenação da CMVM: Condenou Armando Esteves a  uma coima de 25 mil euros em 2011
Decisão (1.ª instância): 2012. Confirma condenação da CMVM
Decisão da Relação: Em 2012, Tribunal da Relação de Lisboa confirma condenação
O que estava em causa: suspeitas de uso de informação privilegiada por parte de Armando Esteves, vice-presidente da comissão executiva do Finibanco, num aumento de capital da Finibanco Holding, iniciado em 2008 e confirmado já em 2009
Cartel nas farmacêuticas 
Data dos factos: entre 2001 e 2004
Início da investigação: 2004
Condenação da AdC: Em 2005, a AdC condenou cinco empresas ao pagamento de uma multa de 3,2 milhões de euros e outra de 16 milhões de euros
Decisão (1.ª instância): em 2007, Tribunal do Comércio manda AdC refazer processo
Nova decisão da AdC: em 2008, AdC baixa coimas para 13,5 milhões de euros
Prescrição: houve condenação por cartel, mas algumas infracções prescreveram
O que estava em causa: suspeitas de manipulação de preços por parte cinco laboratórios farmacêuticos em concursos públicos
Caixa Central de Crédito Agrícola Mútuo (accionista do Central Banco de Investimento)
Data dos factos – 2000 e 2001
Condenação do Banco de Portugal: em 2002, Tavares Moreira, presidente do banco, foi condenado
Decisão (1.ª instância): Confirma decisão do BdP
Decisão (Relação): Anula decisão e manda repetir julgamento
Prescrição: contra-ordenação prescreveu.