segunda-feira, outubro 13, 2003

Falou-se hoje, no fórum da tsf, de um novo programa escolar no qual se inclui a discussão de programas televisivos como o Big Brother, bem como de telenovelas, em substituição de textos literários. Não pude falar porque não houve tempo, embora o moderador tenha arranjado uma brechazinha para dar notícias do futebol, como se em Portugal não houvesse outro momento nem outro espaço de comunicação em que se pudesse referir os jogos que a selecção vai fazer, mas enfim, siga.

É de facto inadmissível que se espetem com bombas destas nas ventas imberbes dos alunos, como se estes não fossem já suficientemente sujeitos à estupidificação, vinda de quase todos os lados.
Dito isto, posso também dizer que, por um lado, compreendo o ponto de vista segundo o qual, exigindo a cultura um diálogo constante entre o indivíduo e o mundo que o rodeia, torna-se forçoso que os futuros adultos pensem a respeito daquilo com que se relacionam, e não há grandes dúvidas de que aquilo com que a maior parte dos futuros adultos se relacionam, é com a televisão e todo o seu cortejo de bons e maus programas. O bb e as telenovelas fazem os jovens pensar, no dia a dia, e é a partir daí que os professores lhes querem pegar.
Só que quem assim raciocina, esquece-se de um pormenor essencial: é que a escola serve para ENSINAR, isto é, para mostrar COISAS NOVAS. Se não for a escola a dar aos jovens uma porta de entrada no mundo do pensamento português, ninguém mais o fará, numa altura em que até boa parte, ou mesmo a maior parte dos programas televisivos feitos por portugueses, nos canais portugueses, são baseados em séries estrangeiras.

Mesmo correndo o risco de parecer pretensioso (e eu ralado), acho que se trata aqui de um confronto de mentalidades, mais profundo e radical do que possa parecer a muita gente, e esse confronto teve a sua expressão no referido fórum da tsf, quando um dos participantes (um sociólogo, creio, e, se for mesmo um sociólogo, isso talvez seja significativo) afirmou, entre outras coisas, que o Latim era uma língua morta. Este participante era favorável ao novo programa escolar, contra a «recitação medievalesca» dos textos de autores antigos, ou coisa parecida.
Em resposta, a convidada, Dr. Maria do Carmo, inimiga absoluta da iniciativa anti-literária e pimbó-televisística, disse, entre outras coisas, que o Latim não morreu, pois que o Português dessa antiga língua descende.
Ora, eu não posso falar em nome do referido participante, mas estou quase certo de que ele não ficou convencido pelos argumentos da Dr. Maria do Carmo. Ele, quando disse que o Latim está morto, falou com toda a sinceridade - ele é daquele tipo de pessoa que acha mesmo que o passado está morto, e o que está morto fica para trás, nada tem a ver com a vida. A dra., pelo contrário, acha que o passado está vivo - está em nós, e só somos como somos porque temos o passado que temos.

O Português é por isso uma língua latina, e ignorar isso é ignorar a própria identidade portuguesa.

E é o avanço da mentalidade bastardizante e anti-tradição que está a fazer com que Portugal fique cada vez mais doente, vítima da infecciosa rasquite.

1 Comments:

Blogger Afonso de Portugal said...

«Em resposta, a convidada, Dr. Maria do Carmo, inimiga absoluta da iniciativa anti-literária e pimbó-televisística, disse, entre outras coisas, que o Latim não morreu, pois que o Português dessa antiga língua descende.»

E é precisamente por causa dessa falta de cultura e de respeito pelas nossas raízes linguísticas que depois surgem os abortos ortográficos, essas aberrações elitistas que nos afastam cada vez mais do Latim e nos aproximam cada vez mais do brasuguês...

18 de setembro de 2019 às 18:48:00 WEST  

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