segunda-feira, novembro 10, 2014

DESCOBERTA NECRÓPOLE DE HÁ QUATRO MILÉNIOS E MEIO EM TORRES NOVAS

Fonte: http://www.ionline.pt/artigos/portugal/necropole-pre-historica-4500-anos-descoberta-portugal/pag/-1
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Uma necrópole pré-histórica, datada de há 4.500 anos, foi descoberta durante as obras em curso no antigo Convento do Carmo, em Torres Novas, revelando um conjunto de objectos, entre os quais uma quinzena de peças em ouro, muito bem conservados.
António Faustino Carvalho, arqueólogo que chefiou as escavações, especialista em Pré-História da Universidade do Algarve, disse à agência Lusa que o achado revela “um grande valor patrimonial e científico”.
Tratando-se de um hipogeu (escavação subterrânea) calcolítico (da Idade do Cobre), o sítio arqueológico encontrado é um local de exumação colectiva, possivelmente uma família, concluindo os especialistas, pela tipologia de objectos encontrados, que se trataria de um grupo social de elite.
António Carvalho disse à Lusa que nesta escavação foram encontradas ossadas humanas, que vão ser agora objecto de estudo mais detalhado, que se supõe corresponderem a 11 ou 12 pessoas, uma delas uma criança com três ou quatro anos, dois adolescentes com menos de 16 anos e os restantes adultos, dois dos quais com mais de 40 anos, já idosos para a época.
Entre os objectos encontrados, resultantes dos ritos funerários que passavam pela deposição junto dos corpos de objectos que poderiam ser úteis noutra vida, estão cerca de 15 peças em ouro – um anel em espiral e contas de colar (chapas dobradas formando tubinhos por onde passaria o fio).
Foram ainda encontradas outras peças que se supõe terem pertencido a adornos (colares ou pulseiras), como pequenas conchas marinhas coloridas (beijinhos ou, nome científico, trívia monacha) e pequenos discos em pedras de várias cores, peças que António Carvalho imagina intercaladas com os tubinhos em ouro fazendo adornos “muito bonitos e muito compostos, com matérias e cores diferentes”, além de botões em osso animal, perfurados para passar a linha.
O achado de conchas indica que o grupo, sedentarizado em Torres Novas, teria tido contacto com o mar, ou por deslocações ou por trocas com populações do Litoral, disse.
No local, uma gruta artificial aberta num tufo calcário, "muito fácil de trabalhar com instrumentos em pedra", estavam também duas adagas em cobre, facas usadas para luta corpo-a-corpo, o que indicia a existência de elementos guerreiros naquela sociedade, um alfinete de cabelo em cobre e recipientes em cerâmica.
António Carvalho afirmou que o grupo pertencia aos primeiros povos metalúrgicos, que começaram por trabalhar o cobre, tendo o ouro surgido praticamente na mesma altura.
O arqueólogo disse à Lusa ter ficado surpreendido com o achado, porque este tipo de sítio arqueológico apenas era conhecido na zona de Lisboa e de Setúbal.
“É o primeiro hipogeu calcolítico que aparece nesta região e o primeiro a ser descoberto desde os anos 1930”, não havendo nenhum arqueólogo vivo que tenha escavado uma estrutura deste género, afirmou.
A intervenção no antigo Convento do Carmo, para acolher os Paços do Concelho, teve uma primeira fase de intervenção arqueológica em 2011 e 2012, durante a qual foram descobertos alguns enterramentos humanos dos séculos XVIII e XIX.
Com o recomeço da obra, a empresa contratada para acompanhar os trabalhos, a Crivarque – Estudos de Impacto e Trabalhos Geo-Arqueológicos, deparou-se com a “descoberta inesperada de um sepulcro pré-histórico”, tendo, face à “complexidade e raridade” da descoberta, António Carvalho sido convidado a liderar a escavação.
A Secretaria de Estado da Cultura determinou a escavação e documentação da totalidade do sítio, trabalhos que foram concluídos em Outubro último, seguindo-se agora uma fase de datação das ossadas por radiocarbono e análise química dos ossos para estudo das patologias e da alimentação.
Pertencendo as peças ao Estado, serão depositadas no Museu Nacional de Arqueologia, sendo objectivo de António Carvalho conseguir uma parceria entre a Universidade do Algarve, o município e a Crivarque para a realização de uma exposição em Torres Novas.
Por outro lado, juntamente com outros investigadores de várias especialidades, o arqueólogo espera que deste achado “resulte um estudo completo”.
O Convento do Carmo começou a ser construído em 1558, tendo sido transformado em hospital depois da extinção das ordens religiosa e da sua passagem para a Santa Casa da Misericórdia de Torres Novas, em 1882.